INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI MUNICIPAL EM FACE DAS SOCIEDADES PROFISSIONAIS DE ADVOGADOS.

 

O Supremo Tribunal Federal informou, em 01/06/2023, o trânsito em julgado da questão constitucional suscitada no Leading Case RE nº 940769, do respectivo Tema 918, cuja tese foi firmada nos seguintes termos: “É inconstitucional lei municipal que estabelece impeditivos à submissão de sociedades profissionais de advogados ao regime de tributação fixa em bases anuais na forma estabelecida por lei nacional”.

Tema 918 STF.

Situação do Tema: Trânsito em Julgado.

Questão submetida a julgamento: Recurso extraordinário em que se discute, à luz dos artigos 146, III, a e d; e 150, III, da Constituição da República, a possibilidade, ou não, de a Administração Tributária Municipal de Porto Alegre, por meio da Lei Complementar Municipal n. 7/1973, exigir ISSQN fora das hipóteses do art. 9º, §§ 1º e 3º, do Decreto-Lei 406/1968 (lei complementar nacional) de sociedade profissionais de advogados que atuem em seu território.

Tese firmada: É inconstitucional lei municipal que estabelece impeditivos à submissão de sociedades profissionais de advogados ao regime de tributação fixa em bases anuais na forma estabelecida por lei nacional.

Leading Case RE 940769.

Relator: Ministro Edson Fachin.

Data do reconhecimento da existência de repercussão geral: 06/10/2016.

Data do julgamento de mérito: 24/04/2019.

Data de publicação do acórdão de mérito: 12/09/2019.

Data do trânsito em julgado: 01/06/2023.

RELATÓRIO

O Senhor Ministro Edson Fachin (Relator):

Cuida-se de embargos de declaração opostos pelo Município de Porto Alegre, em face do acórdão mediante o qual o Supremo Tribunal Federal, apreciando o Tema 918 da sistemática de repercussão geral, deu provimento ao recurso extraordinário para declarar inconstitucional lei municipal que estabelece impeditivos à submissão de sociedades profissionais de advogados ao regime de tributação fixa em bases anuais na forma estabelecida por lei nacional. Confira-se a ementa:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. DIREITO TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA – ISSQN. BASE DE CÁLCULO. LEI COMPLEMENTAR NACIONAL. SOCIEDADE DE PROFISSIONAIS. ADVOGADOS. COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA DE MUNICÍPIO. REGIME DE TRIBUTAÇÃO FIXA. NATUREZA DO SERVIÇO. REMUNERAÇÃO DO LABOR. DECRETO-LEI 405-1968. RECEPÇÃO. LEI COMPLEMENTAR 7/1973 DO MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE. CONFLITO LEGISLATIVO. ISONOMIA TRIBUTÁRIA.

1. A jurisprudência do STF se firmou no sentido da recepção do Decreto-Lei 406/1968 pela ordem constitucional vigente com status de lei complementar nacional, assim como pela compatibilidade material da prevalência do cálculo do imposto por meio de alíquotas fixas, com base na natureza do serviço, não compreendendo a importância paga a título de remuneração do próprio labor. Precedente: RE 220.323, de relatoria do Ministro Carlos Velloso, Tribunal Pleno, DJ 18.05.2001.

2. É inconstitucional lei municipal que disponha de modo divergente ao DL 46/1968 sobre base de cálculo do ISSQN, por ofensa direta ao art. 146, III, “a”, da Constituição da República.

3. Reduziu-se o âmbito de incidência e contrariou-se o comando da norma prevista no art. 9º, §§1º e 3º, do Decreto Lei 406/1968, por meio do código tributário porto-alegrense. Logo, há inconstitucionalidade formal em razão da inadequação de instrumento legislativo editado por ente federativo incompetente, nos termos do art. 146, III, “a”, do Texto Constitucional.

4. Fixação de Tese jurídica ao Tema 918 da sistemática da repercussão geral: “É inconstitucional lei municipal que estabelece impeditivos à submissão de sociedades profissionais de advogados ao regime de tributação fixa em bases anuais na forma estabelecida por lei nacional”.

5. Recurso extraordinário a que dá provimento, com a declaração incidental de inconstitucionalidade dos arts. 20, §4º, II, da Lei Complementar 7/73, e 49, IV, §§3º e 4º, do Decreto 15.416/2006, ambos editados pelo Município de Porto Alegre. Argumenta pelo esclarecimento do “caso em julgamento referir-se exclusivamente à situação peculiar e diferenciada das sociedades de advogado, em razão de seu regime jurídico específico (Estatuto da Advocacia), que expressamente veda sua caracterização como sociedades empresárias”. Sustenta a embargante que deve-se “afastar obscuridade para deixar claro que a inconstitucionalidade declarada incidentalmente é apenas de natureza formal, ou seja, decorre da falta de competência do Município para complementar a legislação nacional a respeito dos requisitos para cabimento da tributação privilegiada em favor das sociedades de advogados”. Afirma também que deve-se “sanar omissão do julgado para aclarar que o Supremo Tribunal Federal não apreciou no julgamento em questão os requisitos da legislação nacional para o enquadramento das sociedades de profissionais em geral na tributação de ISSQN por alíquota fixa”. Por fim, observa que “em consequência do reconhecimento da declaração da inconstitucionalidade formal dos dispositivos da legislação municipal, imperativo que o acórdão deixe claro não estar afastada a possibilidade de o Município, em ato legítimo de fiscalização, descaracterizar a tributação privilegiada, com fundamento na legislação nacional, quando constatar no caso concreto que a sociedade não se caracteriza como sociedade profissional, nos termos do Art. 9º, §§ 1º e 3º, do Decreto-Lei 406/68, bem como nos casos de fraude, simulação, abuso de direito, etc”.

Em suas contrarrazões, Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Estado do Rio Grande do Sul – OAB/RS afirma que os presentes declaratórios tratam “de uma clara tentativa de assegurar à municipalidade, mesmo diante do revés judicial sofrido no presente recurso extraordinário, um modo de “viabilizar juridicamente” a continuidade das abusivas autuações de ISSQN lavradas em desfavor dos escritórios de advocacia”. Em manifestação, Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (CESA) sustenta inexistir qualquer omissão ou contradição a serem sanadas.

É o relatório.

VOTO

O Senhor Ministro Edson Fachin (Relator): Não prospera a irresignação da parte embargante. De acordo com o estatuído no art. 1022 do CPC/2015, são cabíveis embargos de declaração nas hipóteses de obscuridade, contradição ou omissão do decisum atacado e, ainda, para corrigir erro material. Entretanto, no caso, não se verifica a existência de quaisquer das deficiências em questão, pois a decisão embargada enfrentou e decidiu, de maneira integral e com fundamentação suficiente, toda a controvérsia posta no recurso.

Com efeito, restou consignado na decisão embargada que é inconstitucional lei municipal que disponha de modo divergente ao DL 46/1968 sobre base de cálculo do ISSQN, por ofensa direta ao art. 146, III, “a”, da Constituição da República. Ademais, ficou decidido que reduziu- se o âmbito de incidência e contrariou-se o comando da norma prevista no art. 9º, §§1º e 3º, do Decreto-Lei 406/1968, por meio do código tributário porto-alegrense. Logo, há inconstitucionalidade formal em razão da inadequação de instrumento legislativo editado por ente federativo incompetente, nos termos do art. 146, III, “a”, do Texto Constitucional.

Vê-se que todas as alegações de omissão e/ou contradição já haviam sido muito bem dirimidas no acórdão embargado. Não podem, portanto, ser acolhidos embargos declaratórios que, a pretexto de alegadas omissões do decisum embargado, traduzem, na verdade, seu inconformismo com a decisão tomada, pretendendo rediscutir o que já foi decidido. Nesse panorama, inexistente qualquer obscuridade, contradição ou omissão no julgado embargado, conforme exige o art. 1022 do CPC/2015, impõe-se a rejeição dos presentes embargos de declaração.

A propósito, destacam-se os seguintes julgados:

EMENTA - Embargos de declaração em agravo regimental em recurso extraordinário. Petição de recurso não subscrita por prefeito municipal. Ilegitimidade recursal. Ausência de omissão, contradição ou obscuridade na decisão embargada. Mero inconformismo. Rediscussão não admitida em sede de embargos. Embargos declaratórios rejeitados. 1. Os embargos de declaração constituem recurso de fundamentação vinculada e restrita às hipóteses legais expressas, sendo cabíveis apenas quando se verificar omissão, contradição, obscuridade ou erro material no julgado recorrido, não se prestando para veicular razões de mero inconformismo, rediscutir a matéria ou deduzir pretensão de revisão da decisão embargada. 2. Não há no acórdão embargado os vícios de omissão, contradição ou erro material apontados pelo embargante, tendo a Corte decidido o feito fundamentadamente, nos limites necessários ao deslinde da controvérsia. 3. Embargos declaratórios rejeitados. (STF - RE: 1298670 RS 0314676-06.2019.8.21.7000, Relator: DIAS TOFFOLI, Data de Julgamento: 23/05/2022, Primeira Turma, Data de Publicação: 20/06/2022).

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE OU ERRO MATERIAL. TEMA 339. MULTA PREVISTA NO ART. 1.021, § 4º, DO CPC. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS. RECURSO MANIFESTAMENTE PROTELATÓRIO. MULTA APLICADA.

I. Os embargos de declaração apenas são cabíveis, nos termos do art. 1.022 do CPC, quando no acórdão recorrido estiver presente omissão, contradição, obscuridade ou erro material. II. São manifestamente incabíveis os embargos quando exprimem apenas o inconformismo da parte embargante com o resultado do julgamento, ao buscar rediscutir matéria julgada, sem lograr êxito em demonstrar a presença de um dos vícios previstos no art. 1.022 do CPC.  III. O acórdão embargado não ofendeu o art. 93, IX, da Constituição, na interpretação dada pelo Supremo Tribunal Federal ao julgar o Tema 339 da Repercussão Geral ( AI 791.292-QO-RG/PE). IV. A multa processual aplicada no julgamento do agravo regimental, que tem finalidades repressiva e preventiva, foi aplicada de forma correta, dentro dos limites previstos pelo art. 1.021, § 4º, do CPC, e por meio de acórdão que expôs de forma clara as razões pelas quais ela foi imposta. V. O art. 1.021, § 4º, do CPC constitui importante ferramenta que visa à concretização do princípio da razoável duração do processo, contido no art. 5º, LXXVIII, da Constituição, o qual não se coaduna com a interposição de recursos manifestamente inadmissíveis ou improcedentes. VI. Embargos de declaração rejeitados, com aplicação de multa (art. 1.026, § 2º, do CPC). (STF - AgR-ED RE: 1146211 PR - PARANÁ 0005963- 53.2009.8.16.0001, Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento: 04/05/2020, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-118 13-05-2020).

Ante o exposto, rejeito os embargos de declaração. 

É como voto. (Min. Edson Fachin).

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, rejeitou os embargos de declaração, nos termos do voto do Relator. Plenário, Sessão Virtual de 21.4.2023 a 2.5.2023. 

Composição: Ministros Rosa Weber (Presidente), Gilmar Mendes, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Luiz Fux, Roberto Barroso, Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Nunes Marques e André Mendonça.

ASSIM, COMO VISTO, o Tema 918 adotou a tese de inconstitucionalidade de lei municipal que estabelece impeditivos à submissão de sociedades profissionais de advogados ao regime de tributação fixa ou per capita em bases anuais na forma estabelecida pelo Decreto-Lei nº 406/1968 (recepcionado pela Constituição da República de 1988 com status de lei complementar nacional).

Wilson Campos (Advogado/Especialista com atuação nas áreas de Direito Tributário, Trabalhista, Cível e Ambiental/ Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG, de 2013 a 2021/Delegado de Prerrogativas da OAB/MG, de 2019 a 2021).

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Comentários

  1. Dr. Wilson esse artigo veio a calhar em meu trabalho de final de curso de especialização. Obrigado mesmo. Leio sempre seu Blog e seus artigos nos jornais e cada vez mais me surpreendo com sua facilidade em ensinar por meio de seus artigos nota 10. Aprendo muito. Valeu mesmo e o assunto interessa muito a nós advogados de carreira e militantes do dia a dia. A advocacia agradece-lhe. Abração. Moacyr Lorenz.

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  2. Nós tivemos um problema desse tipo no nosso escritório de advogados e advogadas associados. O município queria tributar à sua vontade ultrapassando até o próprio Código Tributário e a CF. Parece que algumas decisões unânimes do STF tem ajudado a resolver a questão mas ainda tem município que não aprende e tem de ir para o Judiciário aprender a respeitar o que já é tema de repercussão geral. Meu caro Dr. Wilson Campos, como sempre atento e um verdadeiro operador do direito em prol da nossa categoria e da nossa sociedade. E como o senhor sempre diz: a cidadania agradece. Parabéns. At: Joana K.S. Vieira.

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