MALANDRAMENTE PERMITIDO



(Este artigo mereceu publicação do jornal ESTADO DE MINAS, edição de terça-feira, 14 de fevereiro de 2017, pág. 7).


O uso da malandragem, da esperteza e da inteligência para obter vantagem, quase sempre ilícita, coloca o indivíduo no centro das atenções. Nesse quesito, os políticos brasileiros se destacam e, em determinadas situações, dão de lavada em quaisquer outros, mundo afora.

O que era para ser exemplo torna-se repugnante. O que era para ser trabalho torna-se artimanha. O que era para ser representação torna-se espetáculo. O que era para ser coletivo torna-se individual. O exemplo, o trabalho, a representação e o coletivo que se lixem, porque o repugnante, a artimanha, o espetáculo e o individual são os termos que, de fato, interessam aos “nobres” representantes do decadente Parlamento brasileiro.

A imprensa tem sempre farto material para trabalhar e bem informar a sociedade. Notícias de malandragens não faltam na política brasileira. O “malandramente permitido” virou um bordão questionado nas rodas populares, técnicas e empresariais, uma vez que o comportamento ambíguo das autoridades não respeita tempo nem espaço. Todas medem o seu interesse pessoal com a régua da ganância desarrazoada. A vergonha alheia que se dane, porque os cargos públicos protegem e acobertam o “malandramente permitido”.

Nem bem começou o ano e as notícias que chegam dão conta de que os crimes políticos proliferam, interminavelmente, nos mais diversos setores. Entra governo e sai governo, com os mesmos males, que vão desde a lavagem de dinheiro, corrupção ativa e passiva, peculato, concussão, excesso de exação, descaminho, prevaricação, condescendência, extravio, improbidade, sonegação, apropriação indébita, tráfico de influência, fraude e favorecimento pessoal, até o irrefreável recebimento de propina. 

A Polícia Federal tem se desdobrado na árdua tarefa de investigar e responsabilizar políticos e empresários suspeitos desses crimes, somados ao enriquecimento ilícito e vantagem indevida. Muitos dos suspeitos se transformam rapidamente em culpados.

Não bastasse isso e muito mais que acontece neste país, o Supremo Tribunal Federal (STF) está cada vez mais abarrotado de ações penais que não têm relação com a sua principal finalidade, que é o controle concentrado de constitucionalidade e a guarda da Carta Magna.

O “malandramente permitido” tem ocupado muito do tempo dos ministros da Suprema Corte, que se debruçam na análise de densos processos penais, sobejamente advindos da “casta” política, sempre blindada pelo nojento foro privilegiado. Com isso, o STF não produz satisfatoriamente para a sociedade, posto que se ocupa em tempo integral a tratar das malandragens dos políticos.

O foro privilegiado dos políticos brasileiros é uma vergonha tão grande que surpreende até mesmo os próprios, que sempre se livram por meio de imunidades e escapadelas para instâncias inferiores. O “malandramente permitido” facilita a renúncia a mandatos para que a ação seja julgada em juízos de primeiro grau, possibilitando as manobras domésticas daqueles que já foram condenados pelo povo, mas mantidos soltos e em banho-maria pelos tribunais estaduais.

Faltam juízes nos tribunais. As demandas judiciais são cada vez maiores e o contingente de aplicadores da justiça cada vez menor. O Judiciário se revela lento. Os julgamentos não ocorrem e a sociedade se sente injustiçada. Enquanto o cidadão comum implora por decisões judiciais céleres, os políticos usam do “malandramente permitido” e tudo fazem para que as suas sentenças nunca cheguem. O foro privilegiado é uma desgraça para a sociedade e uma benção para os maus políticos.

Resta ao povo acabar com o “malandramente permitido”, ou seja, não eleger mais esses maculadores do voto; não admitir o retorno desses malversadores do erário; exigir cadeia para os culpados e a respectiva devolução do dinheiro desviado; cobrar a criação de um tribunal exclusivo que julgue esses políticos desonestos; e reivindicar a volta do STF para as suas funções institucionais fundamentais – proteger, guardar e fazer respeitar a Constituição da República.

Tudo isso sem jamais consentir o “malandramente permitido”.

Wilson Campos (Advogado/Especialista em Direito Tributário, Trabalhista e Ambiental).

(Este artigo mereceu publicação do jornal ESTADO DE MINAS, edição de terça-feira, 14 de fevereiro de 2017, pág. 7).

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