JUÍZA MANDA REDUZIR PETIÇÃO DE DEFESA



Tem determinadas coisas que parecem inacreditáveis, mas acontecem. Vejam o inusitado caso, que apesar de estranho e anormal, já está formando “jurisprudência” entre alguns juízes:

A juíza do Trabalho Elisangela Smolareck, de Brasília/DF, mandou que o advogado de empresa reclamada (Banco do Brasil) reapresentasse defesa inicialmente protocolada com 113 páginas.

Para a magistrada, tal fato configura “desrespeito ao Poder Judiciário, tão abarrotado de processos (especialmente contra a empresa reclamada), em que o Juiz precisa ater-se aos elementos realmente necessários ao deslinde da lide”.

A julgadora concedeu prazo de 5 (cinco) dias para a reapresentação da defesa em no máximo 30 páginas, “sob pena de incorrer em multa por ato atentatório da dignidade da Justiça, ora fixada em R$ 30 mil, sujeita a execução imediata” (Processo nº 0000325-63.2017.5.10.0005).

Adotando procedimento parecido, juiz imita despacho de colega para criticar petição longa. Esse foi o caso do juiz de Direito Roger Vinicius Pires de Camargo Oliveira, da 3ª vara da Fazenda Pública de Curitiba/PR, que determinou em ação civil pública que o Ministério Público (MP) reduzisse a inicial de 144 folhas a uma versão objetiva.

“Segundo a Unesco um texto de 49 páginas ou mais é um livro. Esta petição inicial é, pois, um livro”. A frase, proferida pelo juiz de Direito Valdir Flávio Lobo Maia, do RN, é familiar àqueles que apreciam decisões ou despachos ácidos, mas pouco afeitos às prerrogativas dos advogados. Ora, tudo tem limite e a advocacia exige respeito e moderação.

Observa-se que o magistrado considerou a inicial prolixa e criticou a petição ponderando que forçar a outra parte a ler dezenas, "quiçá centenas", de páginas é "uma estratégia desleal para encurtar o prazo da defesa".

Vê-se que o magistrado potiguar, aparentemente, anda bebendo da mesma fonte de criatividade que seu colega paranaense. Confira a seguir:

PR - 2012 - Seguindo o deliberado pela Unesco, um texto de 49 páginas ou mais é um livro. A petição inicial (144 folhas) é, pois, um livro.
RN - 2014 - Segundo a Unesco um texto de 49 páginas ou mais é um livro. Esta petição inicial é, pois, um livro.
PR - 2012 - O notório excesso de trabalho desta 3.ª Vara da Fazenda Pública (cerca de oitenta mil processos em andamento) não permite ler livros inteiros durante o expediente.
RN - 2014 - O notório excesso de trabalho desta Vara não permite ler livros inteiros durante o expediente.
PR - 2012 - Ademais, tudo o que o autor disse cabe perfeitamente em um número muito menor das páginas que escreveu (não chegando a um livro).
RN - 2014 - Ademais, tudo o que fora dito cabe num vigésimo ou menos das páginas que o autor escreveu.
PR - 2012 - No contexto, não é possível assegurar a razoável duração do processo e a celeridade de sua tramitação (artigo 5.º, inciso LXXVIII da CF/88), sem a indispensável colaboração dos Advogados (CF/88 - art.133), servindo também para o Ministério Público. O tempo que o juiz gasta lendo páginas desnecessárias é tirado da tramitação de outros processos. Portanto, a prolixidade da inicial desrespeita:
RN - 2014 - Não é possível assegurar a razoável duração do processo e a celeridade de sua tramitação (art. 5º, LXXVIII CF) sem a indispensável colaboração dos advogados (CF, art. 133). O tempo que o juiz gasta lendo páginas inúteis é roubado à tramitação de outros processos. Portanto, a prolixidade da inicial desrespeita entre outras coisas:
PR - 2012 - a) a diretriz constitucional de celeridade (art.5.º, inc. LXXVII da CF/88 e o art.125, inc.I do CPC);
b) o princípio da lealdade (art.14, inc. II CPC), porque prejudica desnecessariamente a produtividade do Judiciário; e c) o dever de não praticar atos desnecessários à defesa do direito (art.14, inc. IV do CPC).
RN - 2014 - a) a diretriz constitucional da celeridade (CF art. 5º LXXVII e art. 125 do CPC); b) o princípio da lealdade (art. 14, II, do CPC), porque prejudica desnecessariamente a produtividade do Poder Judiciário, e c) o dever de não praticar atos desnecessários à defesa do direito (art. 14, IV, do CPC).
PR - 2012 - Enfim, a prolixidade do autor contradiz a alegação de urgência da tutela.
RN - 2014 - Enfim a prolixidade do autor contradiz a alegação de necessidade de urgência da tutela, afinal de contas, quem tem pressa não tem tempo de escrever dezenas de laudas numa petição, cujo objeto poderia ser reduzido há pelo menos 20% do total escrito.
PR - 2012 - Posto isso, concedo à parte autora dez dias para emendar a inicial, reduzindo-a a uma versão objetiva com a extensão estritamente necessária, sob pena de indeferimento.
RN - 2014 - Isto posto, concedo à parte autora 10 dias para emendar a inicial, reduzindo-a a uma versão objetiva com a extensão estritamente necessária, sob pena de indeferimento da inicial.

Como operador do direito, particularmente, entendo que os juízes precisam agir com educação e moderação quando tratam com as pessoas e, principalmente, com os advogados e advogadas. Segundo o Estatuto da OAB, a harmonia deve ser recíproca e, “no exercício da profissão, o advogado é inviolável por seus atos e manifestações, nos limites da lei” (Lei 8.906/1994, art. 2º, § 3º).

Por essas e outras, a OAB/DF entrará com medidas no CNJ e no TRT contra o despacho acima da juíza, por ofensa à prerrogativa do advogado. A petição grande pode ser contraproducente, pode ser repetitiva, pode ser tudo, mas enquanto não houver lei dizendo que há limite, ela é, evidentemente, legal. De modo que não cabe à juíza estabelecer um limite, muito menos ameaçar impor uma descabida multa. Ademais, o caso pode ser aparentemente pequeno, mas às vezes é um leading case, cuja decisão importará em inúmeras demandas.

A rigor, a nossa defesa é no sentido de que haja maior interação entre advogados e juízes, evitando-se desgastes desnecessários como os acima relatados. Ora, se a lei não proíbe petições longas, que isso então fique ao encargo do causídico e não do juiz ou juíza.  


Wilson Campos (Advogado/Especialista em Direito Tributário, Trabalhista e Ambiental).



Comentários

  1. ESSES JUÍZES DEVERIAM TIRAR MENOS FÉRIAS E TRABALHAR MAIS, PORQUE 60 DIAS DE FÉRIAS É MUITO E PREJUDICA O JURISDICIONADO NAS SUAS DEMANDAS LEGAIS E JUSTAS. SE A PETIÇÃO É LONGA É PORQUE O ADVOGADO TEVE DE USAR OS MEIOS LEGAIS PARA DEFENDER O INTERESSE DO SEU CLIENTE. ORA, BOLAS. SENHORES JUÍZES...TRABALHEM MAIS E RECLAMEM MENOS. ALIÁS, ISSO VALE PARA O MINISTRO GILMAR MENDES QUE FALA MUITO...FALA MUITO...E SE ESQUECE DAS CAUSAS PENDENTES DE JULGAMENTO NO STF. GOSTEI DO ARTIGO E PARABÉNS AO DR. WILSON CAMPOS, SEMPRE CORRETO E ÉTICO NAS SUAS ESCRITAS. OLAVO J. S. AGUILLAR F.

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