A INDEPENDÊNCIA DOS JUÍZES SOFRE ABALOS DIANTE DO ATIVISMO DO STF.

Não há como fazer vista grossa. Nem mesmo os juízes escapam do excesso de poder do Supremo Tribunal Federal (STF). O Poder Judiciário está perdendo sua independência em face do ativismo exacerbado de ministros da Suprema Corte. A magistratura se mostra tímida diante da ampliação abusiva de atribuição e competência do STF.

Os juízes estão cada vez mais sujeitos às investidas do STF, ou seja, não existe a independência da magistratura quando se trata de contrariar qualquer ato ou vontade de ministros do Supremo. Resta evidente, atualmente, que os juízes comuns são as novas vítimas da competência desmedida e desproporcional do STF.

A democracia brasileira não suporta conflitos e interferências institucionais nesse nível. Os solavancos, ameaças e censuras à liberdade de expressão já atingem em cheio o pilar de sustentação da democracia. Daí a necessidade de bons exemplos, principalmente de um Judiciário que seja imparcial e transparente, em todos os sentidos.

Se o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) defende a necessidade de se respeitarem as decisões das instâncias inferiores do Judiciário para evitar o excesso de processos remetidos aos tribunais superiores, da mesma forma deve ser o comportamento do STF, respeitando os juízes e desembargadores da primeira e da segunda instância, respectivamente, sem travar ou atropelar a jurisdição.

A sempre falada defesa do Estado de direito deve ser exercitada com rigor, mas desde que sejam respeitados os princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência, sob pena de desqualificar os próprios fundamentos que se busca proteger.

As entidades estaduais e nacionais da magistratura e da advocacia precisam atuar com firmeza na proteção dos interesses da sociedade, notadamente primando pela garantia de uma justiça reta, isenta e imparcial. Ninguém está acima da lei, nem mesmo os ministros do STF, que são os guardiões da Constituição da República, mas não são os donos da verdade e não podem personalizar a atividade jurisdicional ao seu alvedrio.

Vejamos apenas três casos entre muitos, que refletem os abusos de competência do STF:

- Os manifestantes do 8 de janeiro em Brasília, a meu sentir, deveriam ter sido julgados pela Justiça Federal, e como os fatos se deram no Distrito Federal, as ações penais deveriam, portanto, ser analisadas pelo primeiro grau do Tribunal Regional Federal da 1ª Região.

- A condenação do presidente Lula foi anulada pela Corte por considerar que houve erro na competência de quem deveria conduzir o processo. Ou seja, a decisão do STF declarou nulas todas as decisões proferidas pela 13ª Vara Federal de Curitiba e determinou a remessa dos autos para a Seção Judiciária do Distrito Federal.

- A recente decisão de ministro do STF, de mandar investigar o juiz José Jácomo Gimenes, da 1ª Vara Federal de Maringá (PR), faz emergir uma série de questões preocupantes sobre a independência do Judiciário brasileiro e reforça a preocupação com a atuação elástica e desmedida de certos ministros da Corte. Ocorre que uma sentença de primeira instância foi cassada per saltum e o juiz foi colocado sob investigação por apresentar singela discordância de uma decisão do STF.

Com visto, nos três casos as atitudes dos ministros do STF são extremamente absurdas e prejudiciais ao Estado de direito, ao devido processo legal e à independência judicial. De maneira geral, o ativismo judicial da Corte causa insegurança jurídica e viola a ordem natural dos feitos. Ora, deve-se respeitar o juízo natural, as prerrogativas dos advogados, a individualização de conduta dos investigados, as decisões transitadas em julgado das instâncias inferiores e os pareceres e recomendações do Ministério Público.

As medidas adotadas em relação aos casos acima citados parecem visar tão somente um recado de quem manda ou acha que manda. E com isso o STF acaba contribuindo para um clima de insegurança judicial, de medo entre os magistrados de instâncias inferiores, de inoperância do MP, de incredulidade da advocacia e de absoluta desconfiança por parte da sociedade.    

Lamentavelmente, a ingerência do STF em casos que não lhe dizem respeito diretamente vem se tornando um costume. Tais atos desarrazoados colocam em xeque a independência judicial e cria um ambiente frio, gelado, de pura intimidação entre os juízes de instâncias inferiores, que passam a temer retaliações ao proferirem decisões que possam desagradar os tribunais superiores. Ou seja, a independência dos juízes sofre abalos fortíssimos diante do ativismo exagerado do STF.

É pública e notória a óbvia hierarquia dentro do Poder Judiciário, que tem o STF como seu órgão máximo. De forma que a Suprema Corte tem o dever de dar o bom exemplo, de agir conforme os rigores da Constituição, de praticar a justiça, de ser o fiel da balança, de aguardar que seja acionada e tirada da inércia para julgar os recursos contra as decisões dos tribunais inferiores, mas sem atropelar as instâncias inferiores ou seus respectivos magistrados, e sem desfazer a linha natural do trâmite, posto que é necessário o cumprimento do devido processo legal.    

A rigor, a meu sentir, o STF deve dar alguns passos para trás, recuperar a confiança dos brasileiros, preservar a independência da magistratura em todos os graus de jurisdição, obedecer aos critérios de investigação, aguardar o curso dos processos e ações nas instâncias inferiores, mostrar que faz parte de um sistema democrático justo e equilibrado, respeitar o devido processo legal e assegurar a todos o direito à ampla defesa e ao contraditório.

Wilson Campos (Advogado/Especialista com atuação nas áreas de Direito Tributário, Trabalhista, Cível e Ambiental/ Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG, de 2013 a 2021/Delegado de Prerrogativas da OAB/MG, de 2019 a 2021).

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Comentários

  1. Rogério Carvalhosa3 de julho de 2024 às 15:38

    Bravo!!! Parabéns colega dr. Wilson Campos. O seu recado é o meu e eu voto com o relator. Muito acertadas suas ponderações e considerações. Abraço cordial. Rogério Carvalhosa.

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  2. Os juízes das comarcas são medrosos e submissos aos ministros do STF. Isso é uma vergonha mas é real. O judiciário está caindo para o fundão do poço e o povo brasileiro sabe disso. Pobre Brasil. Dr Wilson os seus artigos são excelentes. 👏👏👏👏
    Áurea B.

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  3. Gilson A. Durvalino4 de julho de 2024 às 14:08

    Dr. Wilson Campos advogado, os juízes precisam mesmo ser independentes nas suas decisões e apenas serem contestados e contrariados por meio de recursos legais na 1ª e na 2ª e na 3ª instâncias normalmente sem nenhuma intercorrência externa de outra instância a desfazer o serviço feito pelo magistrado. O advogado é que pode recorrer sempre que permitido pelo ordenamento jurídico, mas ministros do STF interferir na forma como o juiz procede é demais. Isso caberia ao CNJ e não ao STF. Pelo amor de Deus. Que isso? Dr. Wilson estou com o snhor e parabéns pelo excelente texto jurídico. At: Gilson A. Durvalino.

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  4. Concordo com o artigo do adv. dr. Wilson e com os comentários e assino embaixo. Fátima Queiroz.

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  5. Antonio J. Linhares Franco Jr.4 de julho de 2024 às 16:37

    Eu li no jornal essa notícia do ministro Alexandre de Moraes que fez isso de mandar investigar o juiz que não fez exatamente como ele queria. Tem base uma coisa dessa? ...(A recente decisão de ministro do STF, de mandar investigar o juiz José Jácomo Gimenes, da 1ª Vara Federal de Maringá (PR), faz emergir uma série de questões preocupantes sobre a independência do Judiciário brasileiro e reforça a preocupação com a atuação elástica e desmedida de certos ministros da Corte. Ocorre que uma sentença de primeira instância foi cassada per saltum e o juiz foi colocado sob investigação por apresentar singela discordância de uma decisão do STF). Onde o judiciário vai parar desse jeito? Juiz desrespeitando juiz e o CNJ deixado de lado e a OAB não fala nada e nem se posiciona. E as entidades dos magistrados onde estão? Todos calados com medo. Êta Brasil. Meu prezado causídico doutor Wilson parabéns pelo seu blog sempre verdadeiro e correto nas posições e argumentações. Antonio J.Linhares Jr. (adv/consult.).

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