REMENDOS NA LEI ORGÂNICA.



Não há explicação para atos dessa natureza, quando o poder público municipal deixa de lado os princípios da transparência e da publicidade, e volta a praticar, mais uma vez, maldades com a sociedade belo-horizontina. O Projeto de Emenda à Lei Orgânica 06/14 é um desrespeito aos moradores e às poucas áreas verdes ainda restantes na cidade.

Há dois anos, por ocasião da tragédia das chuvas, o alcaide disse: “Nós devíamos ter sido um pouco mais "babás" dos cidadãos para que eles não corressem riscos”. Recentemente, quando do trágico desabamento do viaduto na Av. Pedro I, volta à carga o governante com palavras que entristecem os munícipes, pois segundo ele, "acidentes como esses, infelizmente, acontecem”. Posteriormente, o alcaide pediu desculpas. 

Data máxima venia, senhor prefeito, esses lamentáveis acontecimentos são indesculpáveis, uma vez que causam mortes e deixam feridos, além da profunda tristeza que consome as famílias, os amigos e a sociedade em geral. Embora seja compreensível, por óbvio, que o gestor não desejou os tristes episódios, a culpa não deixa de ser da administração municipal, objetivamente, posto que a ela cabe a fiscalização das obras na cidade e responde pelos danos materiais e morais causados a terceiros, independentemente da existência de culpa, nos termos do Art. 37, § 6º, da Constituição. 

Os sofrimentos impingidos à coletividade nos dois imperdoáveis acontecimentos somam-se ao projeto de emenda que a Prefeitura de Belo Horizonte, por ato do Executivo municipal encaminhou à Câmara dos Vereadores, para apreciação.

O referido projeto, com emenda que modificaria a Lei Orgânica da cidade, dá nova redação ao artigo 40, permitindo a utilização das áreas protegidas da capital para instalação de equipamentos públicos de educação e saúde, desde que as construções não ultrapassem o limite de 15% da área total da unidade e sujeitem-se à aprovação do órgão colegiado de gestão do meio ambiente.

Ocorre que a Lei Orgânica Municipal em vigor veda ao Poder Público edificar, descaracterizar ou abrir vias públicas em praças, parques, reservas ecológicas e espaços tombados do Município, ressalvadas as construções estritamente necessárias à preservação e ao aperfeiçoamento das mencionadas áreas.

Assim, enquanto a lei atual proíbe, a emenda proposta pela prefeitura visa permitir a construção em áreas protegidas, que abrigam importantes espécies da fauna e da flora. Ora, qualquer alteração nesse sentido é inadmissível, ainda mais sem estudos prévios, sem a oitiva das comunidades e sem a respectiva compensação ambiental.

A “emenda” pretendida, com certeza, sairá pior que o soneto, uma vez que irá comprometer ainda mais a qualidade ambiental e de vida na cidade, além do que fere de morte o Princípio da Proibição do Retrocesso Ecológico.  

No entanto, considerados os justos fins alegados pela prefeitura e no ensejo de se otimizar a ocupação dos espaços públicos disponíveis, a sugestão dos moradores é no sentido de que se faça isso começando pelos terrenos públicos que ora se encontram sob a custódia da PBH Ativos S/A (empresa de economia mista que foi criada pela prefeitura para administrar terrenos públicos espalhados pela cidade).    

Segundo noticiado pela imprensa local, a PBH Ativos S/A recebeu a doação de 53 terrenos públicos do município, avaliados em R$155 milhões, e pode vender esses terrenos, colocá-los como garantia de empréstimo ou utilizá-los em parcerias público-privadas. Portanto, é pertinente notar que cabe à Câmara Municipal fiscalizar essa empresa, exigir do Executivo que coloque a questão social da emenda sob a análise das comunidades, de forma absolutamente transparente, em prol da coletividade, e viabilizar as obras sociais pretendidas pela prefeitura, através dos terrenos públicos alienados à PBH Ativos S/A, que são, na verdade, terrenos da municipalidade, ou seja, terrenos do povo. 

Por fim, cabe reiterar que o diálogo com a população é imprescindível, sobretudo no Estado de direito e na harmonia da vida democrática, e que a maneira cordial de escutar os reclamos dos cidadãos ainda é a mais acertada e a mais próxima da verdadeira cidadania. 

Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG).

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