MATA DO PLANALTO
Na reunião ordinária do Conselho Municipal de Meio
Ambiente (COMAM), realizada no dia 23/03/2016, em Belo Horizonte/MG, véspera de
feriado, estava na pauta, no item 5, o Processo Administrativo nº
01.076465/10-02 para Reanálise de Licença Prévia do empreendimento de Petiolare
Empreendimentos S/A (do grupo Direcional Engenharia S/A), sucessora da Rossi
Residencial S/A, com pedido de autorização ambiental para construção de prédios
nos terrenos da Mata do Planalto (área verde, típica do Bioma Mata Atlântica,
localizada no Bairro Planalto, região norte da capital, com área de 119.630,89
m², que conta com exuberantes fauna e flora e 20 nascentes). O empreendimento
consiste de 760 unidades residenciais, 1.016 vagas de estacionamento e
115.140,96 m² de área construída.
A reunião que teve início às 13:30 horas e
estendeu-se para além das 18:00 horas, contou com a participação das
comunidades dos bairros circunvizinhos à Mata do Planalto e de várias outras
comunidades e entidades defensoras do meio ambiente da cidade.
Inúmeras intervenções foram feitas pela sociedade,
no transcorrer da reunião, requerendo ao COMAM a não concessão de
licenciamento ao empreendimento.
A certa altura das manifestações populares foi
apresentado um vídeo com entrevista do senhor Vasco de Oliveira Araújo,
presidente do COMAM e Secretário Municipal Adjunto de Meio Ambiente, gravado
por uma emissora de televisão, com ele afirmando: "e é isso aí que nós estamos lutando para licenciar". A
referência é à luta dele e da maioria dos conselheiros que buscam aprovar as
licenças do mega empreendimento imobiliário, em detrimento da vontade da
população e em prejuízo inestimável da preservação do meio ambiente.
A entrevista do senhor Vasco Araújo pode ser
conferida no link:https://plus.google.com/100258558287436160220/posts/CgnK5nRUx9n
Após essa revelação nada recomendável por parte de
um agente público e diante da indignação das pessoas presentes, face ao vídeo
com a fala do presidente do COMAM, que age de forma parcial e voluntariamente
favorável ao empreendedor, alguns conselheiros se levantaram e se retiraram da
reunião, em protesto aos acontecimentos evidenciados. A desconfiança imperou no
auditório lotado. O presidente do COMAM, depois de muitos protestos do público
presente contra o procedimento de determinados conselheiros que permaneceram no
recinto, decidiu suspender a reunião para o final de abril/2016, quando o
assunto voltará à pauta.
O Relatório lido na reunião pelo conselheiro
relator aduz no item 6, às fls. 9, que "Assim
87% dos entrevistados aprovam a medida". Ora, baseado em que o relator
afirma que 87% dos entrevistados aprovam o empreendimento apresentado?
No mínimo, o relator deveria declinar no seu
Relatório os nomes e endereços das pessoas que apoiam a medida, aos moldes do
procedimento adotado na Ação Popular judicializada contra o Município de Belo
Horizonte, por este procurador, que juntou nos autos os abaixo-assinados de
mais de 11.000 cidadãos e cidadãs que exigem a preservação integral da Mata do
Planalto.
O Relatório, logo no seu preâmbulo, consta o
empreendedor Direcional Engenharia, enquanto que na pauta da reunião ordinária
convocada pelo COMAM, item 5, consta Petiolare Empreendimentos S/A.
Afinal,
quem, de fato, é o empreendedor, independentemente de que se trate de grupo
econômico?
Outro fato que merece detida avaliação no
Relatório é a citação do EIA/RIMA, que foi elaborado em 25/02/2010, ou seja, há
mais de 6 (seis) anos, restando, absolutamente, desatualizado.
No mínimo, o Relatório deveria exigir a atualização
do EIA/RIMA, antes de formular manifestação favorável ao empreendimento, bem
como, pedir estudo por parte da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, posto
que seja de sua competência a determinação de novos estudos e respectivas
atualizações.
As falhas do Relatório e o voto favorável, sem que
haja cumprida a finalidade da função pública, merecem análise do MPMG,
inclusive, de responsabilização do agente público.
Relativamente ao EIA-RIMA, ao EIV, ao ADENSAMENTO
DA REGIÃO e ao surgimento de uma NOVA NASCENTE, vale enfatizar as considerações
que também merecem análise do MPMG, inclusive, de possível responsabilização
dos agentes públicos que negligenciaram nas suas funções, em detrimento da
proteção do meio ambiente e dos interesses difusos e coletivos da sociedade, a
saber:
Considerando a desatualização e a insuficiência do
EIA-RIMA apresentado pela empresa contratada pelos empreendedores, a falta de
requisitos obrigatórios pelo impacto urbanístico do empreendimento, e a
incoerência de autorizar a licença prévia de instalação antes da consulta ao
COMPUR e realização do EIV - Estudo de Impacto de Vizinhança;
Considerando que são obrigatórios, portanto, no
EIA/RIMA elaborado para a análise de viabilidade do licenciamento ambiental do
empreendimento previsto para a área da mata do Planalto, os requisitos
previstos na Lei 10.257/2001, que estabelece em seu artigo 37: "O EIV será
executado de forma a contemplar os efeitos positivos e negativos do
empreendimento ou atividade quanto à qualidade de vida da população residente
na área e suas proximidades, incluindo a análise, no mínimo, das seguintes
questões: I – adensamento populacional; II – equipamentos urbanos e comunitários;
III – uso e ocupação do solo; IV – valorização imobiliária; V – geração de
tráfego e demanda por transporte público; VI – ventilação e iluminação; VII –
paisagem urbana e patrimônio natural e cultural. Parágrafo único - Dar-se-á
publicidade aos documentos integrantes do EIV, que ficarão disponíveis para
consulta, no órgão competente do Poder Público municipal, por qualquer
interessado";
Considerando
que no EIA-RIMA produzido pela empresa contratada, Myr Projetos Sustentáveis, não constaram os requisitos necessários à concessão, pelo COMAM, da
licença prévia ao empreendimento, pois faltou no seu bojo o EIV e conforme esclarecido
acima, o EIV não é peça acessória do empreendimento, mas condição para sua
análise e aprovação;
Considerando
que o empreendimento imobiliário trará repercussões urbanísticas para a Cidade
de Belo Horizonte; que de acordo com a Lei Nº 10.257, de 10 de julho de 2001,
em seu art. 36, a lei municipal deverá definir os empreendimentos públicos ou
privados em área urbana que dependerão de elaboração de Estudo Prévio de
Impacto de Vizinhança (EIV); que, por sua vez, a Lei 7.166/96, do município de
Belo Horizonte, em seu art. 74-B, II, dispõe que edifícios residenciais que
tenham mais de 300 (trezentas) unidades estão sujeitos ao licenciamento
urbanístico do COMPUR; que o art. 74-C determina que os empreendimentos
tratados no art. 74-B estarão sujeitos à elaboração do EIV; que o projeto do
empreendimento prevê 760 apartamentos, portanto, estando enquadrado no art.
74-B e consequentemente sujeito à elaboração do EIV (no bojo do EIA-RIMA) e a
consulta ao COMPUR;
Considerando
o alto adensamento populacional na região, que será aumentado enormemente em
função da Operação Urbana Consorciada - OUC/ACLO já determinada pela Prefeitura
Municipal de Belo Horizonte para a região norte da cidade; o trânsito e a
demanda por transporte público, que devem ser abordados no EIV, de forma
atualizada e transparente; a ameaça de extinção de 20 nascentes, quando se vive
uma situação crítica de escassez de água; a diversidade da fauna de mais de 68
espécies de pássaros, além de répteis, anfíbios e mamíferos; a riqueza da flora
representada, entre outros, por ipês-amarelos, mandacaru, copaíba e
jacarandá-caviúva, que são proibidos de corte e constam da lista de espécies em
extinção pelo Ministério do Meio Ambiente;
Considerando o surgimento de uma nova nascente, ou
outras nascentes (fato reconhecido pelo COMAM e pelo empreendedor) nos terrenos
da Mata do Planalto, com evidente erro crasso no georeferenciamento anterior, o
que remete a reposicionamento das nascentes já demarcadas em 2010 e insta criar
APP em área proposta para ocupação no setor norte;
Considerando
que a Mata do Planalto é uma área de solo 100% permeável, com harmonia da
fauna, da flora e das nascentes, na ambiência do habitat natural, e representa
a exuberância das últimas áreas verdes da capital;
Considerando
o infausto argumento utilizado pelo Município de que parte da Mata do Planalto
restará preservada e que isto é suficiente para resolver a questão da
“vegetação”, desmerece todo o contexto histórico e cultural que este patrimônio
ambiental da cidade possui, haja vista que a intervenção no patrimônio, com o
fatiamento do seu território, seja em qual proporção se dê, é uma agressão
abusiva ao patrimônio ambiental em questão, um ato ilegal que não pode ser
autorizado, ainda mais porque não se trata apenas de autorizar a devastação de
um mínimo de vegetação, como quis fazer parecer o Comam (órgão ambiental
municipal) em seu parecer, mas pelo fato primordial de que, conforme foi
fartamente demonstrado, a população do entorno possui uma relação íntima com a Mata
do Planalto, e nesta relação territorial com uma área de preservação ambiental,
típica de Mata Atlântica, é o interesse público que efetivamente deve ser
preservado e protegido para a presente e as futuras gerações, nos termos do
festejado art. 225 da Constituição Federal;
Considerando a responsabilidade por ato de
improbidade administrativa do agente público que dá causa a danos ao meio
ambiente natural, urbano e patrimônio cultural e paisagístico, e viola os
princípios da administração pública, em especial o princípio da legalidade, nos
termos dos artigos 10 e 11 da Lei 8.429, de 2 de junho de 1992;
Considerando os crimes previstos na Lei Federal
9.605/1998 que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de
condutas e atividades lesivas ao meio ambiente;
Considerando que violar o Princípio de Vedação ao
Retrocesso Ecológico é ilegal e coloca em risco os direitos constitucionais
assegurados ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, numa declarada ameaça
ao disposto no art. 225 da Constituição;
Considerando o vídeo que revela a ausência de
imparcialidade do agente público no trato dos interesses da população, conforme
disponibilizado no link https://plus.google.com/100258558287436160220/posts/CgnK5nRUx9n;
E, por fim, considerando as falhas do Relatório que
se revela favorável ao empreendimento, sem, no entanto, relatar: sobre a
resposta ao ofício da equipe técnica ao Secretário Municipal de Meio Ambiente
questionando sobre a necessidade de atualização de estudos (resposta que não
aconteceu e o Relatório se furta a informar); sobre o fato de que a SMMA chegou
a pedir a atualização do EIA-RIMA e voltou atrás (sem maiores explicações);
sobre a descoberta de nova nascente nos terrenos da Mata do Planalto, com
evidente erro crasso no georeferenciamento anterior, o que remete a
reposicionamento das nascentes já demarcadas em 2010 e insta criar APP em área
proposta para ocupação no setor norte; sobre a não análise da SMMA dos
pareceres dos órgãos de interface, conforme Recomendação do Ministério Público
do Estado de Minas Gerais - MPMG (a análise não foi realizada pela SMMA); e
sobre o parecer da BHTrans solicitar atualização do RIC para análise (essa
análise não foi realizada e a exigência é de que seja prévia).
REQUER a sociedade organizada, diante das
manifestações contrárias à supressão da Mata do Planalto, os pleitos coletivos no
sentido da imediata apuração das responsabilidades dos agentes públicos, da
instauração do inquérito de praxe pelo MPMG e das ações judiciais e providências
cabíveis na manutenção da defesa da ordem jurídica, do regime democrático, dos
interesses sociais e individuais indisponíveis e dos direitos difusos e
coletivos da população. Tudo isso, diante das falhas e das irregularidades do
processo administrativo e das evidências que violam as necessárias
transparência e imparcialidade da administração pública, que, ademais,
desrespeita os princípios previstos no artigo 37 da Constituição da República (da
legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência).
Wilson Campos (Advogado/Especialista em Direito
Tributário, Trabalhista e Ambiental/Procurador na defesa da Mata do Planalto).
Comentários
Postar um comentário