A DESAPOSENTAÇÃO E A REPERCUSSÃO GERAL.



A desaposentação, o sobrestamento do feito, a devolução de valores e a repercussão geral pelo STF:



Preliminarmente, cumpre frisar que o reconhecimento da repercussão geral da desaposentação pelo Supremo Tribunal Federal (STF) não tem o condão, por si só, de suspender os processos em trâmite no primeiro grau de jurisdição, sendo necessária determinação expressa da Corte Constitucional nesse sentido.

Resta descabida a suspensão do processo de desaposentação em razão de admissão de repercussão geral.

Sobre o assunto, confira-se a jurisprudência pacífica da Corte Regional (TRF1):

"ADMINISTRATIVO. PREVIDENCIARIO. APOSENTADORIA. RENÚNCIA. DIREITO INDIVIDUAL DISPONÍVEL. DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA. DESAPOSENTAÇÃO. UTILIZAÇÃO DO TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO EM OUTRO BENEFÍCIO. POSSIBILIDADE. 1. Nos termos do § 1° do art. 14 da Lei 12.016/2009, "Concedida a segurança, a sentença está sujeita obrigatoriamente ao duplo grau de jurisdição. 2. A suspensão do processo até o julgamento da matéria sob repercussão geral perante o Supremo Tribunal Federal é providência a ser avaliada quando do exame de eventual recurso extraordinário a ser interposto, nos termos previstos no art. 543-B do Código de Processo Civil, de acordo com o entendimento firmado pelo STJ. 3. Cuidando os autos de pedido de renúncia e cancelamento de beneficio concedido pela Previdência Social, com o objetivo de concessão de novo benefício e não de pedido de revisão do valor do benefício previdenciário, não há decadência do direito. Precedentes. 4. A aposentadoria é direito patrimonial e disponível, sendo, portanto, passível de renúncia, podendo o titular contar o tempo de contribuição efetuada à Previdência após a primeira aposentadoria para fins de obtenção de novo benefício da mesma espécie, sem que tenha que devolver o que auferiu a esse título. Precedentes desta Corte e do colando STJ. Ressalva do ponto de vista do relator 5. As parcelas vencidas deverão ser compensadas com aquelas percebidas pela parte autora com a aposentadoria anterior desde a data de início do novo benefício e pagas acrescidas de correção monetária que incide sobre o débito previdenciário, a partir do vencimento de cada prestação, conforme Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal. 6. Os juros moratórios são devidos no percentual de 1% (um por cento) do valor de cada parcela vencida incidindo esse taxa até a entrada em vigor da Lei n. 11960/2009, a partir de quando devem ser reduzidos para 0,5% (meio por cento] ao mês, até a apuração definitiva dos cálculos de liquidação. 7. Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federa! (§3º do artigo 109 da CF/88], o INSS está isento de custas, quando a lei estadual específica prevê a isenção, a exemplo do que ocorre nos Estados de Minas Gerais, Mato Grosso, Rondônia e Goiás. 8. Honorários advocatícios incabíveis na espécie (art. 25, da Lei 12.016/2009). 9. Apelação e remessa oficial, lida por interposta, desprovidas. (AC 0011165-08.2012.4.01.3800 / MG, Rel. JUIZ FEDERAL CARLOS AUGUSTO PIRES BRANDÃO (CONV.), Rel. Conv. JUIZ FEDERAL CARLOS AUGUSTO PIRES BRANDÃO (CONV.), PRIMEIRA TURMA, e-DJFl p.645 de 31/10/2014)".

"PREVIDENCIÁRIO. DESAPOSENTAÇÃO. PROCESSO CIVIL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. INDICAÇÃO DE NECESSIDADE DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. ENTENDIMENTO DISTINTO DO ADOTADO PELO TRIBUNAL. CITAÇÃO REALIZADA COM CONTESTAÇÃO APRESENTADA. § 3º DO ARTIGO 515 DO CPC. EXAME DIRETO DO MÉRITO. SUSPENSÃO DO PROCESSO EM RAZÃO DE ADMISSÃO DE REPERCUSSÃO GERAL. DESCABIMENTO. DESAPOSENTAÇÃO PARA OBTENÇÃO DE NOVO BENEFÍCIO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DESTA CORTE E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. DESNECESSIDADE. INEXISTÊNCIA DE OBRIGAÇÃO DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES JÁ RECEBIDOS. RESP Nº 1.334.488/SC - 543-C. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. DEFERIMENTO DE OFÍCIO. (...) (AC 0024008-49.2005.4.01.3800 / MG, Rel. JUÍZA FEDERAL GILDA SIGMARINGA SEIXAS (CONV), Rel. Conv. JUÍZA FEDERAL GILDA MARIA CARNEIRO SIGMARINGA SEIXAS (CONV), PRIMEIRA TURMA, e-DJFl p.36 de 24/10/2014".

Com efeito, a desaposentação pode ser considerada como a renúncia expressa do segurado à aposentadoria já concedida. Fábio Zambitte define o instituto como a reversão da aposentadoria obtida no Regime Geral de Previdência Social ou nos Regimes Próprios de Previdência de Servidores Públicos, com o objetivo de possibilitar a aquisição de benefício mais vantajoso no mesmo ou em outro regime previdenciário.

Dessa forma, após a concessão de uma primeira aposentadoria, o  segurado retorna ao mercado de trabalho e, em função de contribuições efetuadas após a data da aposentação, deseja obter novo benefício, superior àquele que vinha recebendo, em razão do novo tempo contributivo, isto é, implica o cancelamento de uma aposentadoria e o posterior início de outra. Percebe-se que não há violação ao ato jurídico perfeito ou ao direito adquirido, preceitos constitucionais que visam à proteção individual e não devem ser utilizados de forma a representar desvantagem para o indivíduo ou para a sociedade.

Quanto à possível renúncia do benefício previdenciário da aposentadoria, trata-se de direito patrimonial disponível e, por conseguinte, revela-se cabível a contagem do respectivo tempo de serviço para a obtenção de nova aposentadoria, desde que preenchidas as condições legais, o que foi observado no caso, não havendo que se falar em violação do art. 58, §1º do Decreto 2.172/97.

A Primeira Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento no sentido de que concerne ao aposentado o direito de renunciar ao beneficio vigente para percepção de uma nova aposentadoria em condição mais vantajosa, sem que tal ato não envolva obrigação de devolver parcelas, pois as parcelas já aferidas fizeram jus aos proventos, configurando verba alimentar devida. Confira-se a ementa do Acórdão, in verbis: 

"RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. DESAPOSENTAÇÃO E REAPOSENTAÇÃO. RENÚNCIA A APOSENTADORIA. CONCESSÃO DE NOVO E POSTERIOR JUBILAMENTO. DEVOLUÇÃO DE VALORES. DESNECESSIDADE. 1. Trata-se de Recursos Especiais com intuito, por parte do INSS, de declarar impossibilidade de renúncia a aposentadoria e, por parte do segurado, de dispensa de devolução de valores recebidos de aposentadoria a que pretende abdicar. 2. A pretensão do segurado consiste em renunciar à aposentadoria concedida para computar período contributivo utilizado, conjuntamente com os salários de contribuição da atividade em que permaneceu trabalhando, para a concessão de posterior e nova aposentação. 3. Os benefícios previdenciários são direitos patrimoniais disponíveis e, portanto, suscetíveis de desistência pelos seus titulares, prescindindo-se da devolução dos valores recebidos da aposentadoria a que o segurado deseja preterir para a concessão de novo e posterior jubilamento. Precedentes do STJ. 4. Ressalva do entendimento pessoal do Relator quanto à necessidade de devolução dos valores para a reaposentação, conforme votos vencidos proferidos no REsp 1.298.391/RS; nos Agravos Regimentais nos REsps 1.321.667/PR, 1.305.351/RS, 1.321.667/PR, 1.323.464/RS, 1.324.193/PR, 1.324.603/RS, 1.325.300/SC, 1.305.738/RS; e no AgRg no AREsp 103.509/PE. 5. No caso concreto, o Tribunal de origem reconheceu o direito à desaposentação, mas condicionou posterior aposentadoria ao ressarcimento dos valores recebidos do benefício anterior, razão por que deve ser afastada a imposição de devolução. 6. Recurso Especial do INSS não provido, e Recurso Especial do segurado provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (Destacou-se). (REsp 1334488/SQ Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08/05/2013, DJe 14/05/2013)".

Corroborando tal entendimento, destaca-se o recentíssimo julgado do Egrégio Superior Tribunal de Justiça proferido a respeito do tema:

"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE VALORES DECORRENTES DE BENEFÍCIO RECONHECIDO EM JUÍZO, NA EXISTÊNCIA DE DEFERIMENTO DE BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO RECONHECIDO PELO INSS. POSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO DOS ARTIGOS 794 E 795 DO CPC. JURISPRUDÊNCIA FIRME DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Ao segurado é dado optar pelo benefício previdenciário mais vantajoso. 2. O direito previdenciário é direito patrimonial disponível. 3. O segurado pode renunciar ao benefício previdenciário, para obter um mais vantajoso. 4. Não há necessidade de o segurado devolver valores do benefício renunciado. 5. Reconhecido o direito de opção pelo benefício mais vantajoso concedido administrativamente, no curso da ação judicial em que se reconheceu benefício menos vantajoso, sendo desnecessária a devolução de valores decorrentes do benefício renunciado, afigura-se legítimo o direito de execução dos valores compreendidos entre o termo inicial fixado em juízo para concessão do benefício e a data de entrada do requerimento administrativo. Precedentes. 6. Recurso conhecido e não provido. Acórdão. Vistos, relatados e discutidos esses autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEGUNDA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento: "A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do(a) Sr[a). Ministro[a)-Relator(a)." A Sra. Ministra Assusete Magalhães, os Srs. Ministros Humberto Martins, Herman Benjamin e Og Fernandes votaram com o Sr. Ministro Relator. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Mauro Campbell Marques. (Processo: REsp 1397815/RS; RECURSO ESPECIAL: 2013/0264218-6; Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES; Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA; Data do Julgamento: 18/09/2014; Data da Publicação/Fonte: DJe 24/09/2014)".

E mais, no que concerne à necessidade de devolução dos valores recebidos para que o tempo possa ser reutilizado na concessão de nova aposentadoria, a Corte Superior de Justiça também decidiu que o ato de renunciar ao benefício não envolve a obrigação de devolução de parcelas, pois, enquanto perdurou a aposentadoria, o segurado fez jus aos proventos, sendo a verba alimentar indiscutivelmente devida. Nesse sentido: 

"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS ART 20, §§ 3º E 4º. DO CPC. CRITÉRIO DE EQUIDADE RENÚNCIA DE APOSENTADORIA. DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS. DESNECESSIDADE MATÉRIA JULGADA EM RECURSO REPETITIVO. 1. Vencida a Fazenda Pública, a fixação dos honorários não está adstrita aos limites percentuais de 10% e 20%, podendo ser adotado como base de cálculo o valor dado à causa ou à condenação, nos termos do art. 20, § 4º, do CPC, ou mesmo um valor fixo, segundo o critério de equidade. 2. A renúncia à aposentadoria, para fins de aproveitamento do tempo de contribuição e concessão de novo benefício, independentemente do regime previdenciário que se encontra o segurado, não importa em devolução dos valores percebidos. Precedentes. 3. Orientação referendada pela Primeira Seção, no julgamento do Resp nº 1.334.488/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, submetido ao regime do art. 543-C do CPC. 4. Agravos regimentais não providos." (destacou-se) (AgRg no REsp 1319972 / RS; Relator: Ministro CASTRO MEIRA; Órgão Julgador: 2ª TURMA: Julgamento: 04/06/2013; Data da Publicação/Fonte: DJe 13/06/2013) (destacamos). 

Por todo o exposto, deduz-se que a ação de desaposentação deve ter andamento processual normal, independentemente do julgamento da matéria sob repercussão geral perante o Supremo Tribunal Federal, posto que descabida a suspensão do processo em razão de admissão da demorada repercussão, conforme demonstrado nos entendimentos do TRF1. 

Em suma, o trabalhador não pode ser prejudicado e ficar esperando ad aeternum por uma decisão ou julgamento do STF, porquanto a justiça tardia não é justiça, mas injustiça, ainda mais se praticada contra aqueles que muito já labutaram na vida e mesmo depois de aposentados, continuaram trabalhando e contribuindo para a Previdência Social. De sorte que a desaposentação, sem devolução de valores, sem suspensão do processo e com valores mais significativos representa o reconhecimento do esforço do trabalhador.

Wilson Campos (Advogado/Especialista em Direito Tributário, Trabalhista e Ambiental).



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