PROJETO DO BARULHO

   A flexibilização da Lei do Silêncio.


Há um flagrante antagonismo entre o que deseja a sociedade e o que votam alguns parlamentares municipais. A cidade, sempre à mercê de decisões boas e ruins para o seu desenvolvimento, reluta em ser agressiva com os diversos setores, mas se mostra demovida da crença e da razoabilidade, por culpa de uns e inércia de outros. A cidade sofre, e a população também.

Atualmente, tramita na Câmara Municipal o controverso projeto de lei que flexibiliza a Lei do Silêncio em Belo Horizonte. Tal medida, interpretada como inconstitucional e afrontosa às normas regulamentadoras nas esferas federal, estadual e municipal, denota enorme desapreço pela qualidade de vida dos moradores, uma vez que extrapola a práxis recomendada pela OMS e coloca em risco o sossego recôndito do lar, à míngua do conforto das famílias.

O PL 751/2013, de autoria dos vereadores Elvis Cortês (PSDC) e Autair Gomes (PSC), propõe aumentar o limite de ruído permitido em dias úteis, fins de semana e feriados, favorecendo certas atividades locais. Enquanto a lei municipal 9.505/2008, mais conhecida como Lei do Silêncio, prevê nível máximo de emissão de ruídos de 70 decibéis (dB), o inusitado e novel texto legal aumenta para 80 decibéis, beneficiando interesses de determinados segmentos empresariais. A rigor, mostra-se inadmissível o retrocesso projetado contra a população, que restará sujeita aos crescentes barulho e desgaste, ao adoecimento e ao estresse, ferindo de morte os princípios da inviolabilidade, da autonomia e da dignidade da pessoa humana.  

Vale notar que a legislação em vigor dispõe no sentido de que a emissão de ruídos, sons e vibrações provenientes de fontes fixas no município obedecerá aos seguintes níveis máximos fixados para suas respectivas emissões, medidas nos locais do suposto incômodo: em período diurno, das 7h às 19h - 70 dB; em período vespertino, das 19h às 22h - 60 dB; em período noturno, das 22h às 7h - 50 dB atè as 23h59 e 45 dB a partir da 0h. Já às sextas-feiras, aos sábados e em vésperas de feriados, será admitido, até as 23h, o nível correspondente ao período vespertino.

Por outro lado, o projeto de lei em pauta, também chamado de "projeto do barulho", aumenta o limite do nível de ruído permitido para 80 dB e, pior, uma emenda ao PL aumenta para 85 dB, desrespeitando o princípio de vedação ao retrocesso, retirando garantias até então asseguradas e contribuindo para o caos gradativo da poluição sonora, que causa efeitos negativos no sistema auditivo das pessoas, além de causar alterações comportamentais e orgânicas. Ademais, os ruídos afetam a normalidade da vida, causam perda gradativa da audição e ainda desestabilizam o equilíbrio emocional do indivíduo, na contramão dos legítimos direitos da cidadania.

O apelo da sociedade organizada é pelo bom senso dos vereadores, de forma que eles saibam respeitar a opinião da maior parte dos moradores da cidade.

Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG). 

(Este artigo mereceu publicação do jornal O TEMPO, edição de quinta-feira, 14 de julho de 2016, pág. 19).
 



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