PRÊMIO AOS QUE CORROMPEM


"A sociedade não pode admitir o escárnio e o sorrisinho irônico daqueles que se acham acima da lei e da ordem, e ainda saem ilesos, pela porta da frente, sem tornozeleira".


Temos vivido dias de absoluta incredulidade e espanto. Os acontecimentos são tão graves e absurdos que nos desconectam da reação cívica necessária. A desfaçatez dos incriminados é tão grande e de tal forma que a formação de organização criminosa, a lavagem de dinheiro, a corrupção (ativa e passiva), a improbidade administrativa, a ocultação de patrimônio, a gestão fraudulenta, a obstrução da Justiça, o recebimento de vantagem indevida e os crimes financeiros encontram a população brasileira estática e sem reação, tamanhos os crimes cometidos pela política ignara e pelos contumazes portadores da impunidade e do foro privilegiado.

Depois de toda a prática criminosa, os delinquentes, sejam políticos ou empresários, corruptos ou corruptores, apelam para o requerimento preliminar do acordo de leniência ou da delação premiada como tábuas de salvação.

Por um lado, o acordo de leniência visa garantir a “suavização” da punibilidade ao infrator que participou de atividade ilícita, mas que em troca passa a colaborar com as investigações com o intuito de denunciar outros infratores envolvidos no crime. Trata-se de acordo firmado pela pessoa jurídica que cometeu ato ilícito contra a administração pública, cujas empresas concordam em pagar multas em troca de redução de punições. 

A lei anticorrupção estabelece que a multa em acordos de leniência deve ter como parâmetro percentual que varia entre 0,1% e 20% do faturamento, nos termos do artigo 6º, inciso I, da Lei 12.846/2013, que dispõe: "Na esfera administrativa, serão aplicadas às pessoas jurídicas consideradas responsáveis pelos atos lesivos previstos nesta lei as seguintes sanções: I - multa, no valor de 0,1% (um décimo por cento) a 20% (vinte por cento) do faturamento bruto do último exercício anterior ao da instauração do processo administrativo, excluídos os tributos, a qual nunca será inferior à vantagem auferida, quando for possível sua estimação".

Por outro lado, a delação premiada é um meio de investigação consistente em uma troca, onde o Estado oferece benefícios àquele que vier a confessar e prestar informações úteis sobre a prática de um crime com a participação de outras pessoas. Exige-se um resultado efetivo para o processo judicial. Se houver delação sem produção de resultado, o colaborador não terá direito ao prêmio legal. A delação é uma troca entre o delator, que conta o que sabe, e as autoridades, que o premiam com uma possível redução ou extinção da pena.

A principal diferença entre o acordo de leniência e a delação premiada está na concessão de ambas as práticas: o acordo de leniência é firmado por órgãos administrativos do Poder Executivo; a delação premiada, por sua vez, é celebrada pelo Poder Judiciário, em parceria com o Ministério Público. Em ambos os casos, o acusado deverá se comprometer em compactuar com as investigações do ato criminoso do qual participou. Atualmente, o Brasil está no olho do furacão, ou seja, tudo gira em torno desses dois temas.

Resguardados os direitos da ampla defesa e do contraditório, cabe ressaltar que é uma vergonha o que tem ocorrido com os acordos de leniência e as delações premiadas no Brasil, ou seja, estão premiando os que subornam, corrompem e sonegam. Uma prática condenável aos olhos da sociedade e até mesmo do Poder Judiciário, e ninguém toma uma atitude séria e severa. Penalizar maximamente as empresas fornecedoras de propinas e praticantes de caixa 2 e não permitir a impunidade ou a impunibilidade de quem quer que seja, delatores ou delatados, é o mínimo que se espera dos órgãos competentes, mais precisamente da Procuradoria-Geral da República e do Supremo Tribunal Federal. 

Em suma, a sociedade não pode admitir o escárnio e o sorrisinho irônico daqueles que se acham acima da lei e da ordem, e ainda saem ilesos, pela porta da frente, sem tornozeleira. Que vergonha, Brasil!

Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB-MG/Especialista com pós-graduação em Direito Tributário, Trabalhista e Ambiental).

(Este artigo mereceu publicação do jornal ESTADO DE MINAS, edição de quarta-feira, 19 de julho de 2017, pág. 7).

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Comentários

  1. Li o artigo no jornal e concordo com tudo do artigo. A Justiça precisa diferenciar essas duas situações da delação e do acordo de leniência. Eu não sabia direito sobre o assunto, mas agora, com a explicação farta do artigo eu entendo que criminosos são todos, porque todos devem uma satisfação à Justiça e à sociedade dos seus erros e crimes. Muito bom o artigo Dr. Wilson, como sempre. José Carlos J. G. B.

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  2. Dr. Wilson, esse negócio de deixar o cara sair sem a tornozeleira é uma vergonha tão grande quanto a safadeza desses indivíduos. Falta tornozeleira, mas não faltam carros de luxo, motoristas, salários de marajás, apartamentos funcionais, gabinetes lotados de puxa=sacos e bajuladores que são chamados de assessores, ajudas disso e daquilo para completar o salário de marajá, viagens para o exterior, verbas para emendas de deputados, compras de votos, e mais e mais e mais gastos que dão inveja até aos reinados europeus, que não têm tanto luxo e gastança com o dinheiro do povo. Parabéns Dr. Wilson Campos pelo magnífico artigo e que tenhamos forças para ver esse país melhorar e banir esses safados da face da terra. Abraços. Carlos Eduardo G. H. Fo.

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