TRAGÉDIAS E DESASTRES NO PAÍS - A TRISTE CULTURA DA IRRESPONSABILIDADE SOCIAL.



 


A triste cultura da irresponsabilidade social é problema de toda a sociedade. Os maus exemplos estão por todos os lados e precisam ser extintos, e os responsáveis punidos. As pessoas merecem viver sem as aberrações dos assassinatos culturais e sociais. A crueldade e a impunidade, não mais podem ser aceitas no Brasil. As tragédias e os desastres precisam ser evitados, a bem da população.

O incêndio da Boate Kiss em Santa Maria-RS, ocorrido em 2013, tem culpados e a punição pelos crimes não pode ser deletada, quando se constata que a cultura da irresponsabilidade chega ao ponto de a vida humana ser descartável para os caçadores de níqueis. A obra improvisada; a falta de sinalização e de saídas emergenciais amplas e adequadas; o isolamento acústico com materiais impróprios; as vistas grossas do Poder Público e a desculpa de pequeno contingente de fiscais transformaram em luto uma cidade, um estado e um país inteiro. A Boate Kiss só contava com uma saída de emergência disponível, e cerca de mais de 240 pessoas morreram asfixiadas por conta da fumaça tóxica. A tragédia continua impune e as famílias herdaram a dor para sempre.

O desastre ambiental das barragens da mineradora Samarco, em Mariana-MG, em 2015, acarretou a morte de 17 pessoas e, de acordo com o Corpo de Bombeiros, 500 pessoas foram resgatadas. Ainda, segundo a corporação, 185 famílias perderam as casas ou tiveram o imóvel destruído pelo rompimento das barragens. O desastre provocou uma avalanche de rejeitos que geraram danos irreversíveis ao meio ambiente, aos animais e aos moradores do entorno e ao longo do Rio Doce. A tragédia com o derramamento de lama causou prejuízos enormes e ainda impunes. A lama pavimentou os mais de 500 km por onde passou, provocando devastação e causando imensos e fortes impactos até hoje impossíveis de calcular. Todos os atingidos - as pessoas locais; o ecossistema da região; o Rio Doce; os pescadores ribeirinhos; e o meio ambiente inteiro, ainda esperam por Justiça.

A queda do viaduto Batalha dos Guararapes, em Belo Horizonte-MG, em 2014, foi mais uma tragédia que poderia ter sido evitada, não fossem a ganância pelo lucro e a pressa na conclusão da obra. Toneladas de concreto do viaduto desabaram matando duas pessoas e ferindo outras 23. Ainda permanecem as incertezas sobre os desdobramentos da queda do viaduto na Avenida Pedro I, ocorrida durante a Copa do Mundo. Os processos que tramitam na Justiça ainda não apontaram responsáveis pela tragédia, bem como não houve ressarcimento aos cofres públicos dos recursos desperdiçados com a obra erguida na Região de Venda Nova, na capital mineira. Aguardando resultados na Justiça, até hoje, também estão familiares das vítimas e proprietários de edificações vizinhas, que sempre denunciam morosidade do Poder Judiciário e grandes prejuízos sofridos, e ainda relatam mágoas e muito sofrimento com a falta de solução para os transtornos que mudaram as suas vidas.

A tragédia ocorrida em Janaúba, no norte de Minas Gerais, em 5 de outubro de 2017, deu-se pelo ato insano de um vigia de uma creche municipal que colocou fogo em várias crianças que estavam na unidade. No início constataram-se alguns mortos e muitos feridos com queimaduras graves, mas o número de vítimas aumentou com o passar dos dias. Dezenas de crianças entre 3 e 7 anos estavam na escola no momento que o vigia fechou a porta da sala e jogou combustível sobre várias crianças, funcionários e sobre si próprio, ateando fogo em seguida. Como resultado da ação doentia e criminosa do vigilante noturno da escola, um incêndio de grandes proporções tomou conta das dependências, morrendo no local quatro crianças, e deixando dezenas de feridos. Mais seis crianças, as professoras Heley de Abreu e Jéssica Morgana, a auxiliar Geni Oliveira, e o próprio agressor morreram, depois de serem socorridos, totalizando quatorze mortos.

A triste cultura da irresponsabilidade social continua com outros lamentáveis e trágicos acontecimentos, que estão sem resposta satisfatória para a sociedade, porquanto permaneçam inexplicados e sob certa impunidade até os dias atuais: incêndio do Edifício Andraus, em São Paulo-SP, com 16 mortos e 300 feridos, em 1972; explosão do Airbus da Tam, em São Paulo-SP, com 199 mortos, em 2007; incêndio do Edifício Joelma, em São Paulo-SP, com 189 mortos e 300 feridos, em 1974; incêndio do Gran Circus Americano, em Niterói-RJ, com 503 mortos (2/3 eram crianças), em 1961; incêndio da Vila Socó, em Cubatão-SP, com 93 mortos (número oficial) ou 508 (número não-oficial), em 1984; temporal na Serra Fluminense, em Teresópolis, Petrópolis, Nova Friburgo e outras cidades próximas, no Estado do Rio de Janeiro, com 900 mortos e 400 desaparecidos, em 2011.

Diante de tanto horror, não há como o poder público se sentir isento de culpa pelas tragédias que envolvem vidas humanas. O fato de não ser diretamente responsável pela negligência e pelos atos de irresponsabilidade, não exime o poder público da corresponsabilidade, que está diretamente ligada ao fato de permitir a impunidade, o descumprimento de normas, o desrespeito de regras e a desobediência de leis. A falta de fiscalização do poder público é imperdoável.

As autoridades do Executivo, do Legislativo e do Judiciário erram quando obrigam os cidadãos assistirem as tragédias acima narradas, sem, no entanto, mostrarem os culpados, os responsáveis ou aqueles que serão punidos por condenação em pecúnia ou em prisão.

A parte verdadeiramente triste de tudo isso são os crimes intencionais ou não, de omissão ou não, de descaso ou não, que arrasam com vidas e famílias inteiras, deixando a sociedade cada vez mais órfã.

O cidadão sonha com uma pátria alegre, produtiva e solidária, mas o que vê são crimes e desastres impunes e indivíduos gananciosos, abastecidos por lucros a qualquer preço e por negligência pública, restando livres de condenações pelos graves crimes cometidos. Parecem desconhecer a integridade. Ignoram as dores das pessoas. Não cumprem rigorosos critérios de segurança. Pouco se importam com a vida humana.

Mas a sociedade não está cega. Vez ou outra enxerga os erros gritantes do poder público e daqueles que exploram atividades particulares. A sociedade não perdoa a prevaricação, porque a função real das autoridades públicas é a de, obrigatoriamente, estarem preparadas para os riscos do cargo e jamais se omitirem.

O sentimento de revolta e de grande pesar da sociedade, relativamente às tragédias e desastres, não pode ser apenas por minutos, mas sempre e cada vez mais presente na vida social, preferencialmente na busca da precaução e da prevenção dos riscos, e na defesa da vida. 


Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG). 



Comentários

  1. Creio que os governos municipais, estaduais e federal tiveram culpa nessas tragédias, mesmo porque muitas foram por falta de intervenção do poder público, por falta de fiscalização. Como sempre os governos fazem pouco do povo e a dor fica para o povo. Por outro lado gostei muito do artigo. Parabéns Dr. Wilson Campos pelo excelente blog e pelos títulos e temas discutidos. Prof. Elias Higyno S. V. F.

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