CONTRADIÇÃO DA TESTEMUNHA GERA CONDENAÇÃO.


Se há contradição nas provas testemunhais de uma parte do processo, a decisão deve favorecer a outra parte. Esse é o entendimento que vem adotando os tribunais trabalhistas.

Um exemplo das implicações dos depoimentos contraditórios pode ser o seguinte:

A contradição entre a alegação contida na reclamação trabalhista e os depoimentos firmados em audiência levou a juíza Helena Honda Rocha, em sua atuação na Vara do Trabalho de Iturama, a condenar por litigância de má-fé tanto o autor da ação quanto uma testemunha por ele indicada.

O motorista de caminhão trabalhava para uma empresa de transporte rodoviário, prestando serviços para uma indústria de alimentos. Na ação, ele afirmou que cumpria jornada das 5h às 23h, com 15 minutos de intervalo para almoço e 15 minutos para o jantar, todos os dias do mês, sem folga, incluindo domingos e feriados. Disse ainda que despendia de 8 a 10 horas diárias na espera de carregamento e descarregamento. Só que, em audiência, apresentou versão diferente, confessando que usufruía uma hora a uma hora e meia de intervalo. Segundo afirmou, quando chegava de viagem no sábado, por volta das 12h, carregava novamente na segunda, por volta das 18h.

“Alterando a verdade dos fatos, com o objetivo de auferir vantagem indevida, o Reclamante deixou de proceder com lealdade e boa-fé, revelando a litigância de má-fé”, registrou a julgadora, decidindo condená-lo a pagar 5% sobre o líquido que resultar da condenação, com base nos artigos 793-B e 793-C da CLT.

De igual modo, a magistrada aplicou multa à testemunha, que buscou favorecer o trabalhador e sua tese em depoimento. A testemunha entrou em contradição com o que foi reconhecido pelo próprio autor em audiência. Para a juíza, ficou evidente que a intenção era confirmar a versão apresentada na reclamação, sem se preocupar com a verdade. Essa testemunha moveu ação contra as rés, com os mesmos pedidos e, conforme observou a julgadora, poderia simplesmente ter ajuizado a reclamação com o colega, o que não fez.

Diante disso, a juíza determinou a expedição de ofício ao Ministério Público Federal para apuração de crime de falso testemunho e advertiu o advogado do autor de que deverá conversar com o seu cliente, de modo a trazer para os autos pedidos que reflitam a realidade, sob pena de se presumir coautoria do advogado na ilicitude processual, com consequente condenação solidária, ou mesmo autônoma, por litigância de má-fé. “O direito de ação deve ser exercido com responsabilidade e observância de valores morais, mormente por aqueles que são detentores de conhecimento jurídico vasto, como se pressupõe dos advogados”, ponderou.

Por fim, assinalou que a gratuidade de justiça deferida não abarca a condenação imposta ao trabalhador, cujo valor deverá ser deduzido dos créditos apurados em seu favor. No caso, o motorista teve reconhecido direito a diferenças salariais, multa prevista em cláusula coletiva, reflexos das horas extras quitadas e indenização por horas de espera. Há, no caso, recurso aguardando julgamento no TRT de Minas.

Em suma, a lição que fica é a de que faltar com a verdade em juízo constitui ato atentatório à dignidade da Justiça, o que leva a testemunha a ser condenada ao pagamento de uma multa, tendo como parâmetro a multa pela litigância de má-fé ou nos termos da legislação trabalhista em vigor. Também cabe condenação à parte interessada no processo, que, pretensamente, seria beneficiada pelo falso testemunho.

Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG).


Comentários

  1. Maurício D. Souza Pinto.17 de julho de 2019 às 15:17

    Como advogado vi coisas parecidas acontecerem e fiquei sem saber até que ponto o trabalhador se perde na informação ao advogado e mente, pois o advogado não pode compactuar com a mentira em depoimento no tribunal, embora as partes diretas do processo possam fazer isso, uma vez que não é proibido defender-se e não trazer prova contra si. A verdade sempre é melhor, mas nem sempre o advogado sabe a verdade, porque o cliente as vezes mente e a coisa se perde. Muito bom o artigo do colega Dr. Wilson Campos, advogado brilhante de nossa OAB. Parabéns eminente colega. Abr. de Maurício D.S.P.

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  2. Jayme C. A. Pontes Varella17 de julho de 2019 às 15:32

    Tive uma ação contra minha empresa e a testemunha do empregado fez uma confusão danada na hora de responder as perguntas do juiz. Saiu preso e com uma multa para pagar e o reclamante também. Os dois foram punidos, porque a mentira era bem bolada, mas na hora erraram as informações e datas e até nomes de pessoas. A coisa desandou pro lado deles. Tenho mais de cem empregados e de vez em quando as testemunhas levadas mentem, mas nem todas são apanhadas no flagra. Gostei do artigo e isso narrado de fato acontece e é bom para alertar tanto empregado quanto empregador quanto aos riscos. Parabéns pelo esclarecedor blog e artigos bem escritos. Parabéns Dr. Wilson. Saudações do Jayme Pontes - empresário/industrial.

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