A TERCEIRIZAÇÃO PLENA



Em datas anteriores, esse mesmo assunto foi apreciado aqui neste espaço, com farta argumentação a respeito dos "prós" e "contras" a Terceirização.

Os anos se passaram e as discussões ficaram cada vez mais acirradas. No entanto, a necessidade de emprego em tempos de "vacas magras" fez o governo interino de Michel Temer colocar novamente na pauta do Congresso a tramitação da Terceirização Plena, talvez como teste para a grande prova da votação das Reformas Trabalhista e da Previdência.

A Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei (PL) 4.302, apresentado em 1998, que trata da terceirização generalizada, em todas as atividades, inclusive na atividade-fim, o que a Justiça do Trabalho veda atualmente, e também altera regras para o trabalho temporário.

Foram 231 votos a favor, 188 contra e oito abstenções.

Os "dedicados" representantes governistas passaram horas e dias repetindo que a medida permitirá criação de empregos. Já os representantes do Ministério Público e da Justiça do Trabalho sustentam o contrário: "terceirização sem limites equivale a precarização e ameaça o emprego formal".

A toque de caixa, em tempo recorde, o texto, originalmente de 1998 (governo Fernando Henrique Cardoso), foi retomado e teve relatório aprovado no plenário. O que se votou foi um substitutivo do Senado de 2002, de Edison Lobão (PMDB-MA). O projeto original, de 1998 (governo Fernando Henrique Cardoso), foi aprovado na Câmara em 2000. Em 2003, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, então no primeiro ano de mandato, enviou uma mensagem de retirada do PL 4.302, que não foi lida, e o projeto permaneceu engavetado, até ser retomado no final do ano passado.

Na votação desta quarta-feira (22/03/2017), a oposição, que obstruiu a votação, ainda tentou retomar a leitura da mensagem presidencial e aprovar requerimento para retirada do projeto. Mas, sem sucesso.

Algumas mudanças e exemplos:

Como não há uma lei específica para a terceirização, o tema vem sendo regulado pelo Tribunal Superior do Trabalho, através da súmula 331, de 2003. Segundo o dispositivo, a terceirização é possível apenas se não se tratar de uma atividade-fim, o objetivo principal da empresa. Exemplos: o ato de fabricar carros é a atividade-fim de uma montadora. Pela regra atual, só atividades-meio, como limpeza, manutenção e vigilância na montadora do exemplo, seriam passíveis de terceirização.

O projeto de lei aprovado permite a contratação terceirizada de trabalhadores em qualquer ramo de atividade econômica e em parte do setor público. Como é agora, uma fábrica de parafusos, por exemplo, não pode terceirizar trabalhadores de sua linha de produção, mas poderia contratar dessa forma serviços de limpeza ou alimentação. A nova lei, se sancionada, permitirá que toda a linha de produção seja terceirizada.

A principal mudança se refere à permissão das empresas para terceirizar quaisquer atividades, não apenas atividades acessórias da empresa. Isso significa que uma escola que antes poderia contratar só serviços terceirizados de limpeza, alimentação e contabilidade agora poderá também contratar professores terceirizados.

O projeto também regulamenta aspectos do trabalho temporário, aumentando de 3 (três) para 6 (seis) meses o tempo máximo de sua duração, com possibilidade de extensão por mais 90 dias. Os temporários terão o mesmo serviço de saúde e auxílio alimentação dos funcionários regulares, além da mesma jornada e salário.

Muitos acreditam que a nova legislação incentivará as empresas a demitirem trabalhadores que estão sob o regime CLT para contratar terceirizados, com remuneração menor. Um levantamento realizado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), em 2015, mostrou que os terceirizados recebiam em média 30% a menos que os contratados diretos.

A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) considera a liberação da terceirização de todas as atividades inconstitucional. A entidade entende que o texto mais antigo (o de 1998) é ainda pior que o debatido em 2015.

O PL de 2015, longe de ser o ideal, vem sofrendo algumas alterações e talvez já não atenda os interesses empresariais de transferir renda do trabalho para o capital. O projeto de 1998 é desatualizado não só do ponto de vista de seu conteúdo como de debate democrático. Ou seja, avizinham-se demandas judiciais de todo tipo e para todo gosto.

Há ainda quem acredite que a Terceirização Plena aprovada na Câmara dos Deputados pode trazer mais competitividade ao setor produtivo e ser um estímulo para a retomada dos investimentos em mão de obra. A justificativa é de que em vários países, a admissão de mão de obra terceirizada traz resultados positivos para o aumento da produtividade. Segundo os defensores da ideia é isso que o governo pretende trazer para o mercado de trabalho brasileiro. Embora o tema seja polêmico, alguns especialistas avaliam que a proposta é robusta e completa, e não tira nenhum direito do trabalhador.

Caso seja sancionado pelo presidente Michel Temer, o Projeto de Lei nº 4.302/98 vai assegurar os direitos trabalhistas previstos pela Consolidação das Leis de Trabalho (CLT), como férias e pagamento do 13º salário, ainda que não tenha nenhum dispositivo claro e específico sobre o assunto. O texto prevê que a fiscalização, a autuação e o processo de imposição das multas serão regidas pela legislação trabalhista.

Por enquanto, não há nada no texto que retire os direitos trabalhistas do obreiro. Por isso, será aplicada a CLT.

Outro ponto que favorece o trabalhador, segundo entendimento de alguns setores, é que a responsabilidade da empresa tomadora do serviço é subsidiária. Ao reivindicar os direitos trabalhistas, a empresa terceirizada é quem deverá honrar com os compromissos. Esgotados os recursos da empresa, a contratante será obrigada a arcar com os pagamentos dos direitos. Mas, será que essa é a melhor opção? Vale avaliar melhor a Responsabilidade Subsidiária e Solidária antes de falar em nome do trabalhador.

Em uma eventual ação trabalhista, nada impedirá o trabalhador de ajuizar as duas empresas. O empregado da terceirizada deverá inserir no processo a "primeira reclamada", ou seja, a terceirizada, e a "segunda reclamada", a tomadora. Aliás, isso já é de praxe e corriqueiro na Justiça do Trabalho. E o processo corre contra as duas empresas. Tanto que ambas se defendem, mas a execução corre, primeiramente, contra a prestadora de serviços.

PJ ou "pejotização" - O projeto, no entanto, está longe de ser uma unanimidade no sentido de que pode favorecer o trabalhador. A terceirização irrestrita pode precarizar as relações de trabalho. O projeto aprovado não proíbe a contratação de terceirizados que eram empregados da empresa. Dessa forma, a medida pode gerar demissão em massa de pessoal e fazer surgir a chamada "pejotização" decorrente da terceirização.

A "pejotização" é o processo em que um trabalhador celetista é demitido e contratado como pessoa jurídica (PJ). Acontece que: com a pejotização, os trabalhadores perderão direitos trabalhistas, como Férias, 13º salário, Licença Maternidade, FGTS, Aviso Prévio, entre outros. Esta hipótese, entretanto, é refutada por alguns especialistas, que alegam que não haverá isso; que os trabalhadores terceirizados terão que ter a carteira assinada; que o empregador não vai contratar cada trabalhador com 20 empresas diferentes, por exemplo; e que é uma prática trabalhista que já está na mira do Ministério Público.

Os simpatizantes do projeto argumentam que ele traz segurança jurídica. Mas, mais do que ter essa segurança, é ter a certeza que as empresas vão agir dentro da lei. Ora, um risco pode ser o caso de uma empresa que contrata uma terceirizada sem verificar o patrimônio dela ou a sua pontualidade no recolhimento dos encargos sociais.

Torna-se fundamental e indispensável que as empresas contratantes cobrem a certidão negativa de débito trabalhista da terceirizada, para saber se há e quantas são as ações trabalhistas envolvendo a empresa prestadora de serviços. Outro ponto importante, que vale como recomendação, é que os empregadores não ajam com rigor e façam cobranças ao trabalhador terceirizado como se ele fosse da própria empresa.

Portanto, diante de tantas novidades surgidas com a Terceirização Plena aprovada na Câmara dos Deputados, resta aos trabalhadores e à sociedade aguardar pelos novos capítulos dessa novela intrigante (para os interessados), que ainda tramitará pelo Senado Federal e chegará às mãos do presidente Michel Temer, que, por certo, segundo divulgado pela imprensa, deverá sancionar a referida lei. Contudo, repito: resta aguardar.

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Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB-MG/Especialista em Direito Tributário, Trabalhista e Ambiental).



Comentários

  1. Dr. Wilson, o senhor foi muito feliz na sua fala, de forma clara e direta, com exemplos. Essa terceirização para a atividade-fim pode ser perigosa para a garantia de direitos dos trabalhadores. Uma questão como essa teria de ser debatida amplamente com a sociedade e não apenas com políticos, empresários e sindicatos. Aliás, os sindicatos e centrais sindicais quase nada fazem e quase nada representam para os verdadeiros trabalhadores brasileiros. Não pode-se permitir a troca de direitos conseguidos por muitos anos por uma lei que pode se tornar cada vez mais complicadora para o trabalhador. Alto lá. Vamos devagar com o andor. Parabéns Dr. Wilson, mais uma vez, por seu espírito de cidadania. Agradecido. Josué Félix N.S., trabalhador brasileiro.

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  2. Meu caro advogado, Dr. Wilson Campos, essa terceirização atende ao desespero do governo de dar uma satisfação ao empresariados, porque a reforma trabalhista não vai passar facilmente, porque os trabalhadores vão protestar com força e com veemência nas ruas. Acho que esse governo não tem estofo para tanto. Parabéns pelo artigo e pela contribuição cidadã, com sempre bem-vinda pelos mineiros. Forte abraço. Fausto Brito M. Jr. , Minas Gerais.

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