STF JULGA DESCRIMINALIZAÇÃO DO PORTE DE DROGAS.

 

Certas coisas (equívocos) nunca mudam no Brasil. Vejam, diligentemente, que o Supremo Tribunal Federal (STF) teima em tomar para si atribuições que não lhe pertencem, posto que pertençam à competência do Poder Legislativo.

Desta vez, o caso se trata de descriminalização do porte de maconha e ou drogas no país. Ora, a rigor, cabe ao Congresso Nacional discutir a questão, e o contrário disso é invasão de competência. Porém, haja vista a morosidade do Parlamento em decidir sobre temas polêmicos (drogas, armas, aborto, etc), o STF toma a frente e julga e coloca um ponto final na controvérsia. Está correto? Não! Mas o Poder Legislativo precisa trabalhar mais, legislar mais e dialogar com o STF sobre certos assuntos, sem que um desfaça o trabalho do outro.

Enfim, o STF retomou, na quarta-feira (02/08/2023), o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 635659, com repercussão geral (Tema 506), sobre a descriminalização do porte de drogas para consumo próprio. Único a votar neste dia, o ministro Alexandre de Moraes propôs a fixação de um critério nacional, exclusivamente em relação à maconha, para diferenciar usuários de traficantes.

O ministro afirmou que o artigo 28 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006) deixou de punir com prisão o porte de drogas “para consumo próprio”, mas não define critérios objetivos para diferenciar consumo próprio de tráfico. Essa definição fica a cargo do sistema de persecução penal (Polícia, Ministério Público e Judiciário), que interpreta a norma de formas diversas.

Dessa forma, o porte de pequena quantidade de entorpecentes passou, em muitos casos, a ser qualificado como tráfico, tornando a punição mais dura e aumentando significativamente o número de presos por tráfico. Além disso, pessoas presas com a mesma quantidade de droga e em circunstâncias semelhantes podem ser consideradas usuárias ou traficantes, dependendo da etnia, de nível de instrução, renda, idade ou de onde ocorrer o fato.

Para o ministro, essa distorção decorre do excesso de discricionariedade para diferenciar usuários de traficantes. Em respeito ao princípio da isonomia, ele destacou a necessidade de que os flagrantes de drogas sejam tratados de forma idêntica em todo o país. “O STF tem o dever de exigir que a lei seja aplicada identicamente a todos, independentemente de etnia, classe social, renda ou idade”, afirmou.

Ele propôs que sejam presumidas como usuárias as pessoas flagradas com 25g a 60g de maconha ou que tenham seis plantas fêmeas. Ele chegou a esses números a partir de levantamento que realizou sobre o volume médio de apreensão de drogas no Estado de São Paulo, entre 2006 e 2017. O estudo foi realizado em conjunto com a Associação Brasileira de Jurimetria e abrangeu mais de 1,2 milhão de ocorrências com drogas.

De acordo com o ministro, a autoridade policial não ficaria impedida de realizar a prisão em flagrante por tráfico quando a quantidade de maconha for inferior ao limite. Entretanto, é necessário comprovar a presença de outros critérios caracterizadores do tráfico, como a forma de acondicionamento da droga, a diversidade de entorpecentes e a apreensão de instrumentos e celulares com contatos, por exemplo. Da mesma forma, nas prisões em flagrante por quantidades superiores, o juiz, na audiência de custódia, deverá dar ao preso a possibilidade de comprovar que é usuário.

Após o voto, o relator do RE, ministro Gilmar Mendes, pediu o adiamento do julgamento para construir uma solução consensual, diante dos novos argumentos e da mudança das circunstâncias desde 2015, quando apresentou seu voto, como a implementação das audiências de custódia. Inicialmente ele votou para descriminalizar todas as drogas para uso próprio.

Nos outros dois votos apresentados anteriormente, o ministro Luís Roberto Barroso propôs a descriminalização, exclusivamente em relação à maconha, do porte de até 25 gramas ou a plantação de até seis plantas fêmeas para diferenciar consumo de tráfico, até que o Congresso edite lei sobre o tema. Já o ministro Edson Fachin considera a regra inconstitucional exclusivamente em relação à maconha, mas entende que os parâmetros para diferenciar traficantes de usuários devem ser fixados pelo Congresso Nacional.

Com Alexandre de Moraes, já são quatro ministros favoráveis à descriminalização. Assim, bastam mais dois votos para uma maioria nesse sentido. Além de Moraes, já votaram pela descriminalização Gilmar Mendes (relator), Edson Fachin e Luís Roberto Barroso. Faltam votar André Mendonça, Kassio Nunes Marques, Luiz Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Rosa Weber e Cristiano Zanin, que tomou posse nessa quinta (03/08/2023). O julgamento foi adiado e será retomado nas próximas semanas.

Lado outro, a respeito desta questão, o Ministério Público de São Paulo (MP/SP) se manifesta e diz que: “a aquisição de substâncias psicoativas ilícitas pelo usuário é apenas o ato final de uma longa cadeia de delitos, que todos temos acompanhado nas últimas décadas, que geraram poderosas e violentas organizações criminosas, trazendo às regiões produtoras gravíssimos problemas de ordem pública”.

O MP/SP questiona o que aconteceria se, do dia para a noite, ninguém mais estivesse sujeito à punição na “ponta final da cadeia comercial criminosa das drogas”. “Onde poderá o usuário fumar sua porção de crack? Na calçada da escola? Será admitida a injeção de cocaína na corrente sanguínea numa praça, em plena luz do dia? Aliás, quem venderá a droga? Tais “liberdades” estão realmente de acordo com a Constituição Federal brasileira? Cremos que não”.

ASSIM, data venia, mantenho meus argumentos do início deste texto e acrescento que preocupa-me, sobremaneira, o ilícito grave do tráfico de drogas, pois, a se descriminalizar o porte, poderia estar a se descriminalizar o comércio, algo expressamente proibido pela Constituição Federal. Ou seja, não é possível deixar inteiramente impune o consumidor se é este que alimenta o tráfico e enche de dinheiro o bolso do fornecedor de drogas. Daí a necessidade de o Legislativo debater com o Judiciário as questões pontuais, respeitosamente, sem que isso signifique ou implique interferência de um na seara do outro.

Wilson Campos (Advogado/Especialista com atuação nas áreas de Direito Tributário, Trabalhista, Cível e Ambiental/ Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG, de 2013 a 2021/Delegado de Prerrogativas da OAB/MG, de 2019 a 2021).

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Comentários

  1. Juarez e Maricélia Damasceno.4 de agosto de 2023 às 12:23

    Nós temos testemunho pessoal e somos contra qualquer tipo de droga porque tivemos esse problema na família e sofremos muito e sofremos até hoje com lembranças. Um filho que saiu pelas portas dos fundos da nossa vida e se meteu no meio das drogas e gastou tudo que tinha e mais que conseguiu tirar de nossa família. Só um tratamento caríssimo nos ajudou nessa missão, fora do Brasil, mas até hoje nossos corações estão em pedaços com o caso. Morremos a cada dia um pouco. Droga nunca. Droga mata a pessoa e mata sua família. Droga é o pior mal do mundo. Dr. Wilson nós lemos o seu correto texto todo e sentimos o mesmo que o senhor se permite assim dizer. Abrs. Juarez e Maricélia Damasceno.

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  2. Com esse legislativo fraco e comprável dirigido por Lira e Pacheco, só sobra pro STF mandar.
    Mas porém com esse assunto não tem conversa- o povo ordeiro e as famílias do bem não querem drogas liberadas nunca e nem 5 g e nem grama nenhuma de maconha ou qualquer outra droga. Tudo isso é crime e mata a juventude e as suas famílias. Não!!! Dr Wilson o artigo do senhor é muito bom para abrir os olhos desses ministros do STF. É não as drogas. Abraço do Agnaldo R. Neto.

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  3. Concordo com o adv dr Wilson Campos e acho que consumidor é punição pelo ilícito e tratamento na saúde pública, porque é dever do Gov federal tratar das questões sociais e não só arrecadar impostos e gastar com mordomias. Parabéns dr Wilson. Abraço. Ananias B.

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  4. Cândida M. D. Flores7 de agosto de 2023 às 09:14

    Ou o Brasil muda essa irracionalidade total de governo e instituições ou esse país vai para o buraco de uma vez por todas. O nosso Brasil não pode virar Venezuela ou Cuba, comandados por ditadores letais e um povo tratado feito gado. Droga de jeito nenhum e em nenhuma quantidade porque cadeia de crimes nessa área é grande e só machuca a família e destrói o ser humano. Doutor Wilson Campos esse artigo do senhor me deu esperanças de que temos ainda gente de bem no país e espero que o Congresso brasileiro trabalhe pelo povo e não para seus mesquinhos interesses. Abraço de Cândida M.D. Flores.

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  5. José Francisco P. Silva7 de agosto de 2023 às 09:18

    Para viver não precisa de droga nem de governo liberando droga por mínima que seja. Para viver precisa de Deus e da família e dos amigos e de um governo que governe e não fique brincando de decidir o futuro de uma nação. Meu Jesus Cristo ajude todos nós e nos livra do mal amém. Parabéns Dr. Wilson pelo texto e pela defesa da família. Falta seriedade no governo, no STF e nas pessoas. José Francisco P. Silva.

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