CAIXA DOIS É CRIME.



O debate em torno do tema tem envolvido parlamentares, partidos políticos, sociedade civil, juristas e até ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e do Supremo Tribunal Federal (STF).

Caixa dois é crime, independentemente da interpretação dada pelo ministro Gilmar Mendes, presidente do TSE, que busca no seu vasto conhecimento uma alegação pouco convincente de que “praticar o caixa dois não é crime ou não é crime na ótica da justiça eleitoral”. Ora, causa estranheza o ministro Gilmar advogar a defesa dos envolvidos na prática de caixa dois, esquecendo-se da sua função pública, seja como presidente do TSE ou ministro da Suprema Corte.

Caixa dois é abuso de poder econômico, é ato criminoso contra a democracia, é agressão contra a sociedade brasileira e compromete a lisura do processo das urnas.

O sistema corrupto faz uso indevido da confusão causada em determinadas autoridades do Executivo, do Legislativo e do Judiciário, que tergiversam e pecam pela dúvida no julgamento do mérito da questão do crime de caixa dois.

A ministra Cármen Lúcia, presidente do STF, assegura que caixa dois é crime; é uma agressão; compromete; e não é pouco. Já o ministro Luís Roberto Barroso afirma que apesar de práticas distintas, caixa dois e corrupção são crimes.

Se de um lado, o Ministério Público tem defendido uma nova lei para criminalizar o caixa dois, de outro, políticos têm se movimentado para tentar aprovar a anistia a esse crime. Vale dizer que essa anistia pretendida pelos nobres parlamentares se trata, na verdade, de um perdão para o crime de caixa dois.

Depois do fracasso dessa ideia no ano passado, diante da forte reação da opinião pública, a discussão voltou aos gabinetes de Brasília, na medida em que aumentam as denúncias dentro da operação Lava Jato.

O medo dos “culpados” pela prática criminosa do caixa dois são os trechos vazados dos acordos de delação de executivos da Odebrecht, que revelam repasses ilícitos para inúmeros políticos, de diferentes partidos, entre eles os três maiores do país - PMDB, PSDB e PT, que negam as irregularidades.

Repercute na sociedade a afirmação do empresário Emílio Odebrecht, em depoimento ao juiz Sérgio Moro, de que “o caixa dois sempre foi modelo reinante no país”, de que “existia uma regra: ou a gente não contribuía para ninguém, ou para todos”.

O caixa dois consiste em receber doações de campanha e não declarar os valores na prestação de contas à Justiça Eleitoral, e pode ser punido com até cinco anos de prisão. Nesse sentido é o Artigo 350, do Código Eleitoral Brasileiro (Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965): Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais: Pena - reclusão até 5 (cinco) anos e pagamento de 5 (cinco) a 15 (quinze) dias-multa, se o documento é público, e reclusão até 3 (três) anos e pagamento de 3 (três) a 10 (dez) dias-multa se o documento é particular. Parágrafo único. Se o agente da falsidade documental é funcionário público e comete o crime prevalecendo-se do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamentos de registro civil, a pena é agravada”.

O juiz Sérgio Moro, da Justiça Federal do Paraná, responsável pelos processos da operação Lava Jato, divulgou nota afirmando que “toda anistia é questionável, pois estimula o desprezo à lei e gera desconfiança”. Para o magistrado, caso se confirme a manobra dos parlamentares o futuro da investigação pode estar em jogo. “Anistiar condutas de corrupção e de lavagem impactaria não só as investigações e os processos já julgados no âmbito da Operação Lava Jato, mas a integridade e a credibilidade, interna e externa, do Estado de Direito e da democracia brasileira”, afirmou.

Em meio à polêmica envolvendo a possível anistia, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), defendeu a tese de que “não tem anistia para um crime que não existe”. Para ele, o que está em discussão é "a tipificação, qual a redação da tipificação? Isso o plenário vai decidir”.

O Ministério Público Federal (MPF) discorda. “Na verdade, o discurso de anistia se refere aos outros crimes que estariam por trás do caixa dois: lavagem de dinheiro, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato e evasão de dividas. E essa discussão viria nesse sentido. Porque se você cria um crime hoje de caixa dois esse crime não pode retroagir, é só daqui para frente”, disse o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Caso os deputados ampliem o escopo de caixa dois para esses outros crimes, políticos que cometeram irregularidades durante as campanhas de 2016 e 2014, por exemplo, não poderão ser punidos.

Quem defende a anistia do caixa dois está, na verdade, trabalhando em causa própria, tentando aliviar a falsidade ideológica para fins eleitorais já cometida. Ou seja, os políticos estão querendo anistiar o passado inteiro e não apenas o caixa dois praticado.

Atualmente a prática de caixa dois é considerada uma forma de falsidade ideológica, passível de punição. O mais estranho nisso tudo é a desfaçatez dos nobres parlamentares, que admitem com tranquilidade que houve caixa dois, como se fosse algo banal.

Mais do que isso, o uso do caixa dois, a chamada omissão de receitas, onde o valor declarado é menor que o real, é crime de sonegação fiscal, conforme disposto na Lei 8.137/1990 (que define os crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo):"Art. 1º Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias; II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;...Pena - reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

Um partido que opera caixa dois (sonegação de receita), não respeita o país e muito menos o povo brasileiro, que é transformado em povo dominado. Os políticos que praticam o caixa dois sabem que, para investir R$1,00 (um real) em Educação, essa importância insignificante deve estar prevista no Orçamento da União. Mas para gastar bilhões de reais em juros basta somente que o Banco Central entenda ser necessário e pronto, realizar a façanha com autonomia total e irrestrita. Ora, onde está a fiscalização da Receita Federal? Cadê a exigência do tributo? Como fica a atuação do STJ e do STF quanto à fraude, aos desvios de recursos, à sonegação de receita, à falsidade ideológica e aos crimes contra a ordem tributária?

A Justiça brasileira precisa prosperar muito, trabalhar com energia e de forma imparcial e implacável, porquanto as ilegalidades estejam proliferando rapidamente e tentando contaminar todo o corpo da nação.

Wilson Campos (Advogado/Especialista em Direito Tributário, Trabalhista e Ambiental).



Comentários

  1. Já ouvi vários advogados dizerem que caixa dois é crime e não há discussão. Portanto, o que o Congresso quer é ficar impune depois de tanto desvio de dinheiro sem responder pelo desvio de receita. Isso não pode. A RF deveria tomar uma atitude, em vez de ficar fiscalizando somente as PF e as empresas de pequeno porte. A lei é para todos. Excelente o artigo do Dr. Wilson Campos e esclarecedor até na legislação citada. Lincoln W. P. A; empresário de EPP, BH.

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  2. Dr. Wilson, o seu artigo é excelente e veio em boa hora, porque a discussão sobre isso é grande. Caixa dois é crime sim e deve ser motivo de pena, cadeia, perda de mandato e intervenção nesses partidos de aluguel (todos). Vamos passar esse país a limpo e vamos começar pelos políticos que exploram os brasileiros desde sempre. J. Laudemir O. J. Silva, professor universitário.

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  3. Claro Dr. Wilson, que caixa dois é crime e dos mais graves, pois sonega imposto descaradamente, sem que as "autoridades" tomem uma providência de imediato. A Receita Federal também faz vista grossa quanto a essa desclassificada maneira de fugir da tributação. Parabéns Dr. Wilson pelo pontualíssimo artigo. Como sempre, super acertado. Errado está o governo que fica cego, surdo e mudo, quando lhe interessa ficar assim. Januário Filho, advogado, MG.

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