A DESUMANIDADE DA VALE



Não se trata de dinheiro. A coisa toda padece de desumanidade por parte da mineradora Vale, que pouco se importa com as centenas de mortes causadas, com as outras centenas de pessoas desaparecidas, com o sofrimento das famílias, com a desolação dos lares e com a devastação da fauna, da flora, dos mananciais, das nascentes, dos córregos e dos rios.

A mineradora Vale não se sensibiliza nem um pouco com as vidas que foram ceifadas covardemente, assim como não dá a mínima para a quebradeira dos comércios nas localidades próximas às barragens que romperam, e nem se dá por informada quanto ao desalento dos pescadores ribeirinhos ou quanto ao pedido de socorro das pessoas que foram retiradas às pressas de suas casas por conta de uma sirene que alertou para o perigo de mais uma tragédia. A desumanidade da Vale chega a arrepiar, tamanha a sua indiferença diante de uma situação tão grave.

Em Mariana, Brumadinho, Barão de Cocais, Macacos, Nova Lima, Ouro Preto e em tantas outras cidades e distritos, a vida antes sossegada e calma, bem ao estilo do mineiro, foi-se para sempre, não volta mais, deixou enormes buracos nos corações de pais, mães, filhos, maridos, esposas, parentes e amigos, e transformou lugarejos antes tranquilos em um verdadeiro inferno. De uma hora para outra, tudo mudou, para pior, sem que as pessoas pudessem entender o que estava acontecendo. De um lado, o tsunami de lama e rejeitos de minério descendo o morro e destruindo tudo – vidas, casas, carros, máquinas, equipamentos, instalações, pousadas, árvores, animais, rios, peixes. De outro, as sirenes da mineradora, que antes não funcionaram, mas que agora soam na madrugada, enlouquecendo a todos, que saem em disparada feito bólidos, à procura de sobrevivência em lugares mais altos e mais distantes.

A barragem que rompeu e causou mortes e destruição ambiental em Mariana não serviu de lição. De novo a mesma história e desta vez em Brumadinho, com centenas de mortes, centenas de desaparecidos e muitos prejuízos ao longo da tragédia que se repetiu. Agora, depois de o presidente da Vale dizer que a empresa é uma “joia” e o governador de Minas Gerais Romeu Zema dizer que foi um “acidente”, a população está sem saber qual dos dois é mais desumano e irresponsável, diante de colocações tão impróprias para momentos de absoluta dor e tristeza.

Não bastasse tudo isso, a Vale agora faz ecoar o alarme que antes não funcionou. As populações das regiões de mineradoras em risco de colapso e rompimento já não dormem. O menor barulho, tremor ou algo inusitado na noite já desperta a comunidade. E se o alarme toca, lá vão as pessoas, desnorteadas, sem rumo certo, mas correndo, desesperadamente, na esperança de salvarem suas vidas, as de seus filhos e familiares. Porém, são alojadas em pequenos hotéis, em pousadas e em casas alugadas. As pessoas ficam, a contragosto, tristes, porquanto os locais de hospedagens jamais sejam iguais às suas casas. As pessoas gostam dos seus lares, das suas coisas, dos seus animais, das suas plantas, dos seus móveis, dos seus cantinhos, por mais singelos e simples que sejam.  

A desumanidade da Vale passa por tudo isso acima relatado. E piora ainda mais quando as últimas notícias são no sentido de que o Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais atualizou para 169 o número de mortes em decorrência do rompimento da barragem da mineradora Vale em Brumadinho. A corporação informou que dois corpos foram retirados da lama de rejeitos nos últimos dois dias. Fragmentos de corpos também foram localizados pelas equipes nas últimas horas. De acordo com boletim da Defesa Civil do estado, todos os óbitos já foram identificados. A tragédia na mina Córrego do Feijão, nos arredores da capital mineira, deixou ainda 141 pessoas desaparecidas - entre funcionários da mineradora, terceirizados que prestavam serviços à Vale e membros da comunidade.

A desumanidade da Vale, empresa multimilionária, não deixa os seus dirigentes agir em prol do bem da coletividade. Todos os seus membros, da média à mais alta direção, enxergam apenas lucros e dividendos, e desmerecem a vida dos seres humanos comuns. Triste isso, mas é assim que se avalia a percepção deles, do governo estadual e dos políticos que defendem a mineração a qualquer preço no estado de Minas Gerais, mesmo que seja à custa de centenas de vidas humanas e destroçamentos de famílias inteiras nas terras dos Inconfidentes. Muito triste isso, mas é a realidade que se apresenta no cenário atual do dinheiro, do capital, do investimento e do desenvolvimento empresarial. Primeiro, os impostos, os lucros e a riqueza de uns poucos. Depois, se sobrar tempo, a preocupação mínima com os cidadãos.

E assim caminham a desumanidade da Vale e a omissão do governo.

Wilson Campos (Advogado/Especialista em Direito Tributário, Trabalhista, Cível e Ambiental). 

   

Comentários

  1. Essa de que a Vale é uma jóia foi de dar medo. Pior ainda foi o governador Zema dizer que foi um acidente. Será que esse pessoal não tem temor a DEUS? Será que essa gente da empresa e do governo não enxergam a realidade do que aconteceu, do crime cometido e da irresponsabilidade de todos os envolvidos??? Todos desumanos, como bem disse o dr. Wilson Campos. Todos insensíveis e sem amor nenhum ao próximo. Cadê o respeito? Cadê a Justiça brasileira? Cadê a dignidade humana? Parabéns apenas para o autor do artigo, porque a Vale e o governo merecem pêsames e votos de vergonha, vergonha e vergonha!!! Dra. Juliana MS. pós doutorado em medicina social.

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