PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO.




A questão da perturbação do sossego quase sempre vem acompanhada do excesso de ruídos, que adquire proporções inadmissíveis quando um indivíduo, a pretexto de se divertir ou trabalhar, acaba invadindo com sua perturbação e seus ruídos, o modo de vida de outra pessoa, que se vê compelida a interromper o sono, o descanso, a leitura, o estudo, o lazer ou mesmo o trabalho. Muitos indivíduos acabam ampliando o que chamam de direito ou liberdade de viver de forma pacífica e respeitosa, para o exagerado campo do “eu posso tudo em nome do que me interessa”. Ora, não é bem assim. Esses indivíduos se esquecem de que outras pessoas também têm o direito de protestar, porquanto o que interessa a um não interessa ao outro, naquele momento, sendo necessário o respeito mútuo. Acontece que, na maioria dos casos, as pessoas que perturbam seus vizinhos desconhecem as leis acerca do tema e cometem a contravenção potencializados por um ingrediente usual nestes casos, a bebida alcoólica.

A rigor, existe na nossa sociedade um conceito adotado de forma generalizada de que a produção de ruídos é permitida, por alguma lei, até as 22 horas. No entanto, é uma crença falsa, baseada apenas em crendices populares ou interpretação equivocada de alguma lei municipal. As pessoas desconhecem que, 22 horas é um limite para os ruídos que estão presentes no cotidiano e não para todo e qualquer tipo de barulho. O que é real, de fato, na nossa legislação, é que o excesso de barulho ou ruído é proibido em qualquer horário, mesmo que seja ao meio-dia, por exemplo.

Quando o fato da perturbação ocorre e ainda não são 22 horas, as discussões são inevitáveis, já que as duas partes, em tese, entendem estar com a razão. Pontos de vista diferentes levam a desaforos diferentes. Daí a ocorrência, vez ou outra, de fatos mais graves, como lesões corporais, danos patrimoniais e até homicídios, cometidos por pessoas que jamais tiveram problemas com a Justiça e que, diante das circunstâncias, passam a fazer parte das estatísticas criminais. Lamentavelmente!

A perturbação do sossego configura o exagero por parte do perturbador. Esse exagero pode refletir tanto na intensidade quanto na duração do ruído. Quem sofre esse tipo de perturbação acaba tendo seu estado de ânimo alterado, seja por crises de nervosismo, estresse, insônia ou até mesmo por absorção de doenças psicológicas.

Em decorrência desse e de outros fatos semelhantes, faz-se necessária a conscientização das pessoas acerca dos seus direitos e deveres no tocante à produção de ruídos e à perturbação do sossego. Vejamos os parágrafos a seguir:
 

A emissão de ruídos, em virtude de quaisquer atividades, sejam industriais, comerciais, sociais ou recreativas, deve, no interesse do sossego público, obedecer aos padrões, critérios e diretrizes estabelecidos pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente e acatar as condições fixadas e exigidas pela Associação Brasileira de Normas Técnicas, que visam objetivamente o conforto da sociedade.

Em sendo o controle da poluição disciplinado pela legislação ambiental, de forma geral, fica claro que, para as atividades potencialmente poluidoras, dentre elas as responsáveis pela emissão de elevados níveis de sons, ruídos e vibrações, faz-se necessário o licenciamento ambiental.

Nesse sentido é a punição penal do Artigo 54 da Lei nº 9.605, de 12/2/1998, que dispõe: “Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora. Pena - reclusão de um a quatro anos e multa”.

Como visto, a poluição sonora, que causa efetivamente danos à saúde humana, afetando os sistemas auditivo e nervoso das pessoas, pode levar aquele que a provocar a ser enquadrado nos rigores da lei, como logo acima disposto.

Ademais, a poluição sonora já era disciplinada pelo Artigo 42 da Lei nº 3.688 de 3/10/1941 - Lei das Contravenções Penais, que considera a poluição sonora uma contravenção tipificada como de crime contra a paz pública: “Perturbar alguém, o trabalho ou o sossego alheios: I - com gritaria ou algazarra; II - exercendo profissão incômoda ou ruidosa, em desacordo com as prescrições legais; III - abusando de instrumentos sonoros ou sinais acústicos; IV - provocando ou não procurando impedir barulho produzido por animal de que tem guarda. Pena - prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa.  

Portanto, de clareza solar que desde 1941 a lei já protege o cidadão brasileiro dos incômodos da poluição sonora, ou seja, muito antes de se pensar na questão ambiental da forma ampla como é tratada atualmente, quando ainda não existiam as invasões de áreas residenciais por eventos e shows, que teimam em perturbar o sono, o sossego alheio e a segurança da comunidade.

De real importância que se destaque o papel do município nessa seara de responsabilidades, posto que o artigo 30, inciso VIII, da Constituição Federal dispõe: “Compete aos Municípios - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano”. Ora, resta evidente que a competência para permitir ou proibir a ocorrência de poluição sonora nas áreas urbanas é do município, a quem incumbe o controle, entendendo-se, pelo contrário, como ineficiência, negligência, omissão ou conivência.

Também de competência do município a distribuição adequada das atividades urbanas, de forma compatível, assim como o é a medida mitigadora da poluição sonora, como a restrição ao uso de buzinas em áreas hospitalares e a definição de horários e locais em que podem funcionar atividades conhecidas como causadoras de barulho, tais como eventos musicais, boates, bares, danceterias e outras tantas causadoras de ruídos que tiram o sono das comunidades locais.

Estão comprovados pela ciência médica os malefícios que os ruídos acarretam à saúde. O barulho excessivo causa perturbação da saúde mental. A poluição sonora afeta o meio ambiente e, por conseguinte, viola o direito difuso e coletivo, na medida em que excede os níveis de sons e ruídos, que provocam a deterioração na qualidade de vida, sobretudo quando acima dos limites suportáveis pelo ouvido humano, para o repouso noturno e para o sossego dos moradores.

O que as comunidades querem da prefeitura é ação severa e que cumpra com seu dever constitucional, possibilitando aos cidadãos um pouco de paz, silêncio, sossego para dormir e condições de justo descanso após um dia exaustivo de trabalho. E para que isso aconteça é bastante que o município exija o cumprimento das leis ambientais, da lei municipal específica, do código de posturas e, acima de tudo, não se omita, não negligencie e não seja conivente com esses ruídos que adoecem.

Esse papel, além de ser da prefeitura municipal, também é da Câmara dos Vereadores, que deve trabalhar por uma legislação atualizada, mas a serviço da coletividade, e não de um ou outro empreendimento poluidor e causador de barulho, ruído e perturbação do sossego. A preservação do bem estar da sociedade deve estar acima dos interesses individuais, independentemente do ramo de atividade do poluidor, seja industrial, comercial, social, recreativo ou até mesmo religioso. A saúde, o sossego e a paz social precisam ser cuidados e preservados, para que a harmonia reine entre as pessoas.

Wilson Campos (Advogado/Especialista em Direito Tributário, Trabalhista, Cível e Ambiental).


Comentários

  1. O assunto veio a calhar, porque eu sofro com esse mal da barulheira na minha cabeça, pois moro em um lugar de muitos bares e locais que usam som mecânico. Haja paciência, meu Deus. A gente liga, reclama com a PBH e eles apenas vão lá, quando vão, e fazem recomendação ao infrator. Que fiscalização é essa que não multa e não fecha o local que desobedece a lei? Vamos reagir, porque nesse carnaval 2019 que vai começar cedo demais, a nossa vida vai piorar ainda mais, com algazarra de blocos desorganizados que saem pelas ruas e não obedecem regras nem horário de silêncio. E a PBH vai fazer o que? Dormir no ponto, como sempre? O jeito é rezar e esperar que ninguém adoeça com esse barulho infernal nas nossas cabeças. Mas eu gostei muito do texto do adv. Wilson Campos, como sempre preocupado com os cidadãos e com as famílias. Nota dez pelo assunto e pela forma que cobra da PBH uma atitude de fazer cumprir a legislação. Noêmia Felisberto, de BH.

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