EMPREGADA É CONDENADA APÓS PEDIR “ACERTO” E BURLAR LEGISLAÇÃO.


A demanda trabalhista relatada a seguir, trata-se de tentativa de burlar a legislação e levar vantagem em detrimento do empregador. Uma atitude reprovável, que teve um desfecho negativo para a trabalhadora. Vejamos:

Uma empregada doméstica foi condenada por litigância de má-fé ao mentir durante o processo que ajuizou pedindo o pagamento de verbas rescisórias. Ficou provado que ela rompeu o contrato depois de insistir em fazer um "acerto" com a empregadora a fim de sacar o FGTS e receber o seguro-desemprego. A decisão é do juiz do Trabalho Mauro Vaz Curvo, titular da vara do Trabalho de Primavera do Leste/MT.

Ao procurar o Judiciário, a doméstica afirmou ter sido dispensada sem justa causa ao fim de um ano e dois meses de serviço. Relatou ter recebido valor menor do que tinha direito na rescisão e pediu, entre outros, o pagamento do aviso prévio e da multa de 40% do FGTS.

No entanto, mensagens trocadas pelo aplicativo WhatsApp comprovaram que a trabalhadora pediu, pelo menos quatro vezes nos últimos três meses do contrato, que a empregadora simulasse uma dispensa, argumentando que a patroa não teria qualquer prejuízo e que ela poderia ser registrada novamente após quatro meses.

Com a recusa da empregadora, a doméstica passou a dizer que iria se mudar da cidade e, por fim, a empregadora acatou o pedido de demissão da trabalhadora. Mas, precavida, a ex-patroa procurou a Justiça do Trabalho e depositou os valores devidos à ex-empregada por meio de uma ação de consignação em pagamento.

Ao julgar a reclamação da doméstica, o juiz avaliou que o motivo do término do contrato foi a intenção da trabalhadora de burlar o INSS e a legislação trabalhista para receber indevidamente os valores dos benefícios de quem é dispensado. Concluiu, assim, que a rescisão se deu a pedido da trabalhadora e, ainda, que os valores pagos pela empregadora foram corretamente calculados, não existindo diferenças a serem quitadas.

Por fim, aplicou a pena por litigância de má-fé à doméstica, após a comprovação de que ela mentiu à Justiça. O magistrado lembrou que o processo judicial não pode servir a fins torpes e, independentemente de se tratar de pessoas com mais ou menos posse, essa prática deve merecer uma “repreensão exemplar” por ser uma das causas principais do “inchaço do Poder Judiciário e da demora da entrega da prestação jurisdicional mais célere e eficaz aos jurisdicionados de nosso país”.

A empregada doméstica foi condenada a pagar multa de 5% do valor da causa à sua ex-empregadora, que receberá R$484. E, por ter ficado vencida em todos os seus pedidos, a trabalhadora também terá de arcar com o pagamento dos honorários de sucumbência, também de 5%, em favor dos advogados da defesa.  

        SENTENÇA:

I – RELATÓRIO. Causa submetida ao procedimento sumaríssimo. Dispensado o relatório (art. 852-I, da CLT).
II – FUNDAMENTAÇÃO
MÉRITO
1. Contrato de Trabalho
Não houve controvérsia quanto ao período trabalhado (01.08.2018 a 04.10.2019), a função (doméstica) e o salário (R$ 800,00).
1.1 - Motivo do Término do Contrato
A autora afirma ter sido dispensada sem justa causa em 04/10/2019.
A ré alega que a autora por quatro vezes (09/07/2019, 11/09/2019, 30/09/2019 e 03/10/2019) pediu à empregadora que realizasse "acerto" para que a mesma pudesse sacar o valor depositado junto ao FGTS, bem como para que tentasse receber o seguro desemprego, argumentando ainda que a empregadora não sofreria qualquer prejuízo e que poderia registrá-la novamente após o período de 04 meses, tendo a empregadora sempre se recusado a fazer tal acordo. Aduz ainda que, no dia 30/09/2019, a funcionária afirmou que iria se mudar de Município, bem como, reitera tal fato na data de 03/10/2019, conforme conversa do aplicativo. Por fim, informa ter acatado o pedido de demissão da trabalhadora. Requer que seja reconhecida a rescisão contratual entre as partes por pedido de demissão da autora.
Pois bem.
Face ao Princípio da Continuidade da Relação de Emprego, que milita em favor do empregado, caberia à ré (Súmula 212 do TST) a prova de modalidade diversa da dispensa sem justa causa para a extinção do contrato de trabalho. Não é esse o caso dos autos.
Nas conversas entre as partes por meio de aplicativo de mensagens (Ids n. b177bf4 e 760dc61) conclui-se que, de fato, a intenção da autora era burlar o INSS e a legislação trabalhista para receber os valores do seguro desemprego e sacar o FGTS, o que não seria possível com o pedido de dispensa.
A autora claramente agia de má-fé ao pedir que a ré realizasse um "acerto" e, logo após, lhe recontratasse novamente para trabalhar. Transcrevo um trecho da conversa do dia 11/11/2019:
"Oi boa noite ___________! Eu estava pensando aqui q tem como vc me dispensar, aí depois de 4 meses tem como vc me contrata de novo na carteira. Com o dinheiro do seguro eu pagava as parcelas da Mota".
Destarte, nos termos da fundamentação supra, admito como verdadeiro motivo do término do contrato de trabalho contido na defesa (pedido de dispensa por parte do trabalhador). Por consequência, indefiro o pedido de retificação da data de saída constante na CTPS, o pagamento do aviso prévio e da multa de 40% do FGTS e levantamento dos valores do FGTS e do seguro desemprego.
2. Verbas Rescisórias
O TRCT e o recibo de transferência (Ids n. c717568 e 1b92823) demonstram o pagamento do saldo de salário de 04 dias do mês de outubro, da gratificação natalina proporcional do ano de 2019 e das férias proporcionais acrescidas de 1/3.
Quanto à alegação da autora de pagamento menor do que o devido, razão não lhe assiste. O valor do salário considerado para o cálculo das verbas rescisórias foi de R$ 800,00, conforme descrito na inicial. Portanto, os valores pagos pela ré foram corretamente calculados, não existindo diferenças a serem pagas.
Indefiro.
3. FGTS e multa de 40%
Na petição inicial a autora relatou que a ré não procedeu com todos os depósitos do FGTS durante o contrato de trabalho. A ré contestou o pedido e juntou aos autos os comprovantes de recolhimento do FGTS (Id n. 08425c9).
Pois bem.
Nos termos da Súmula n. 461 do TST, é do empregador o ônus da prova em relação à regularidade dos depósitos do FGTS: "Súmula nº 461 do TST. FGTS. DIFERENÇAS. RECOLHIMENTO. ÔNUS DA PROVA - Res. 209/2016, DEJT divulgado em 01, 02 e 03.06.2016. É do empregador o ônus da prova em relação à regularidade dos depósitos do FGTS, pois o pagamento é fato extintivo do direito do autor (art. 373, II, do CPC de 2015)".
A ré juntou os comprovantes de recolhimento do FGTS (Id n. 08425c9).
Assim, ante a comprovação por parte da ré, competia à autora o ônus de apontar eventuais diferenças devidas. Ônus do qual não se desvencilhou.
Em sua impugnação oral em audiência, a autora se limitou em alegar que os recolhimentos foram feitos a menor.
Destarte, uma vez que a autora não logrou êxito em demonstrar eventuais diferenças dos recolhimentos do FGTS, indefiro o pedido.
4. Multa do art. 477 da CLT
O artigo 477, § 6º da CLT é taxativo e impõe que o pagamento das parcelas rescisórias seja efetuado até o décimo dia contado a partir do término do contrato de trabalho.
O término do contrato se deu na data de 04.10.2019. A ação de consignação em pagamento foi ajuizada pela ré em 14.10.2019, ou seja, dentro do prazo legal.
Destarte, tenho que a ré foi diligente ao ajuizar a ação de consignação em pagamento para quitar eventuais parcelas que entendia devidas. Logo, indefiro o pedido de pagamento da multa prevista no parágrafo 8º do artigo 477 da CLT.
5. Multa do art. 467 da CLT
Não há nos autos verbas rescisórias incontroversas.
Indefiro.
6. Litigância de má-fé
Conforme demonstrado no item “1.1 -motivo do término do contrato”, a autora alterou a verdade dos fatos para obter vantagem indevida, haja vista que a trabalhadora claramente agia de má-fé ao pedir que a ré realizasse um "acerto" e, logo após, lhe recontratasse novamente para trabalhar.
O processo não pode servir a fins torpes e, da mesma forma, a finalidade protetiva do direito material do trabalho que é inspiradora, em boa medida, do direito processual trabalhista, não pode ser deturpada para desservir ao fim de se fazer Justiça. Aqui, pouco importa se estamos a tratar da parte com mais ou menos posses.
Ao litigante de má-fé, seja ele trabalhador ou empregador, impõe-se a observância dos rigores da Lei no que pertine à intolerância, rigidez de tratamento e repreensão exemplar dessa prática que, dentre outros fatores, é uma das causas principais do inchaço do Poder Judiciário e da demora da entrega da prestação jurisdicional mais célere e eficaz aos jurisdicionados de nosso país.
Dessa feita, com aporte no inciso I, do art. 80 e art. 81, ambos do CPC e arts. 793-B e 793-C da CLT, condeno a autora ao pagamento de multa ora fixada no equivalente a 5% (cinco por cento) do valor da causa, qual seja, R$ 484,88 (quatrocentos e oitenta e quatro e oitenta e oito centavos), a ser revertida em benefício da reclamada.
7. Honorários advocatícios
A presente demanda foi ajuizada em 25/10/2019, ou seja, durante a vigência da Lei 13.467/2017.
Desse modo, em relação a este processo, não há qualquer dúvida acerca da aplicação do disposto no artigo 791-A, da CLT, a qual prevê o seguinte: “Art. 791-A - Ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa”.
No caso, constato que houve sucumbência por parte da autora.
Desse modo, condeno a reclamante ao pagamento de 5% sobre o valor da ação, em prol dos patronos da ré, no total de R$ 484,88. A fixação do importe de 5% aos patronos observou os requisitos previstos nos incisos I, II, III e IV, do § 2º, do artigo 790 da CLT.
Deverá ser aplicado o disposto no artigo no artigo 791-A, § 4º, o qual estabelece que “vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário”.
8. Justiça Gratuita
Defiro os benefícios da Justiça Gratuita à reclamante por ter preenchido os requisitos previstos no artigo 790, § 3º e 4º, da CLT.
III – DISPOSITIVO
Diante do exposto, em consonância com a fundamentação supra, julgo IMPROCEDENTES os pedidos formulados na reclamação trabalhista movida ______________________em face de ______________________isentando a ré de qualquer condenação.
Condeno a reclamante ao pagamento dos honorários advocatícios de 5% sobre o valor da causa no total de R$ 484,88, em prol dos patronos da reclamada. Devendo ser aplicado o disposto no artigo no artigo 791-A, § 4º, da CLT.
Condeno a autora ao pagamento de multa ora fixada no equivalente a 5% (cinco por cento) do valor da causa, qual seja, R$ 484,88 (quatrocentos e oitenta e quatro e oitenta e oito centavos), a ser revertida em benefício da reclamada, em razão da pena de litigância de má-fé.
Custas pela reclamante no valor de R$ 193,95, calculadas sobre o valor atribuído à causa (R$ 9.697,57). Isento do recolhimento em face da concessão dos benefícios da justiça gratuita.
As partes ficam advertidas de que não cabem Embargos de Declaração para rever fatos, provas ou a própria decisão, ou, simplesmente, para contestar o que já foi decidido (Artigo 793-B, VII, da CLT c/c 1026, § 2º, do CPC).
Publique-se. Intimem-se as partes. Após o trânsito em julgado, cumpra-se. Nada mais. (Processo nº 0001162-68.2019.5.23.0041 – TRT/23).

DIANTE DO EXPOSTO, em razão da má-fé da empregada, a decisão foi a favor da empregadora, uma vez que restou provado que houve intenção da trabalhadora de burlar o INSS e a legislação trabalhista. A empregada ainda foi condenada a indenizar a ex-patroa e a pagar a sucumbência do advogado da reclamada. Tudo conforme sentença logo acima.

Fonte: Migalhas jurídicas / TRT - 23.

Wilson Campos (Advogado/Especialista com atuação nas áreas tributária, trabalhista, cível e ambiental/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB-MG/Delegado de Prerrogativas da OAB-MG).


Comentários

  1. Essa patroa está certa porque a empregada fez pressão indevida e queria o acerto de qualquer jeito com segundas intenções. Se fosse em outro país de primeiro mundo ela sairia semreceber nada pelo que fez e ainda poderia ser presa. A justiça foi correta e ainda pegou leve porque essa empregada merecia mais puniçãi pelo feio que fez e pagar ainda as custas sem essa coisda de justiça de graça para quem usa de maneira errada a lei. A empregada deveria ter agido de maneira correta . Nem sempre o empregadoganha na justiça como dizempor aí. Meus parabéns Dr. Wilson por trazer informações sobre a vida diária das pessoas.

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  2. Sou bacharel em direito e faço concursos. Nos cursos preparatórios aprendi que o advogado precisa tomar cuidado com as causas que pega para defender. Esse advogado da doméstica que perdeu a causa deveria ter buscado mais informações da empregada porque ela mentiu tanto que cairia em contradição alguma hora. Penso que o prejuízo do advogado de defesa deveria ser pago pela empregada que mentiu para ele e para a Justiça. Isso deveria constar da ata de sentença o direito do advogado receber seus honorários porque quem mentiu foi sua cliente e não ele. Estou certo Dr. Wilson Campos, o senhor que é mestre no direito?. Abraços para o senhor doutor e parabéns pelo brilhante espaço do Blog Direito de Opinião. JCB.

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