OS RISCOS DE EXCESSOS DA COMPETÊNCIA MUNICIPAL


Em razão do Decreto nº 17.356, de 14 de maio de 2020, da parte do prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil, que está em vigor a partir de 18 de maio de 2020, e dispõe sobre a instalação de pontos de fiscalização sanitária para evitar a propagação de infecção viral e preservar a saúde da população contra a doença provocada pelo novo coronavírus (Covid-19), cabe à sociedade acompanhar e vigiar a forma como se dará a execução da medida restritiva, de forma que excessos e ilegalidades não sejam cometidos.

Causa espécie e merece reparo o parágrafo único do artigo 2º do decreto, que afirma, in verbis: “Não serão impostas restrições à saída de pessoas e veículos dos limites do território do município”. Ora, e quanto à entrada de pessoas e veículos no município, qual o critério? A lacuna remete a uma interpretação dúbia do decreto, nada recomendável, posto que o correto fosse não impedir a entrada e a saída do território do município de todos os meios de transporte de cargas e pessoas, individuais e coletivos, bem como não obstar a livre circulação de pessoas e serviços entre os limites municipais, sob pena de infringir norma constitucional, mesmo em situação de emergência.

A rigor, o que é permitido por lei são barreiras sanitárias montadas com equipes de profissionais da área da saúde, que poderão estar amparadas por forças públicas de segurança, como Polícia Militar ou Guarda Municipal - que fiscalizem a circulação de pessoas, bens e serviços a fim de reduzir os riscos de contágio -, mas jamais permitindo a adoção de medidas drásticas como, por exemplo, a limitação de acesso territorial aos municípios, o que implicaria em violação do exercício da autonomia municipal, notadamente no caso da prestação de serviço de saúde por parte do Estado de Minas Gerais, de forma regionalizada e em prol do bem-servir pactuado pelos entes da Federação.

Em várias ocasiões os habitantes da capital têm presenciado a edição de vários decretos por parte do prefeito, como se não existissem 41 vereadores na cidade, eleitos pela população e que precisariam ser escutados a respeito das medidas. Ademais, mesmo em tempos de pandemia há que prevalecer a boa vontade democrática entre o Executivo e o Legislativo, evitando-se o uso tirânico do poder, donde se conclui que a autoridade municipal não pode se esquecer da sua limitação diante do texto constitucional.

As decisões do prefeito carecem de melhor acompanhamento por parte dos vereadores, que foram eleitos para fiscalizar os atos do executivo e não permitir os excessos da competência municipal, que, vez ou outra afloram e ficam sujeitos à moderação legislativa. Daí inferir que as sanções da improbidade administrativa não se exaurem no contexto do ato em si, mas no todo das ideias medianas, típicas de quem não sabe governar no Estado democrático de direito. Tudo bem, as normas vigentes devem ser obedecidas, mas com regular respeito e moderação nas exigências da administração municipal, e sem imposição de absurdos que possam constranger os cidadãos e também sob pena de o município responder pelas penalidades cogitadas que extrapolem limites de atuação da autoridade municipal coatora.

Vale observar que, diante de todo o acontecido na capital, a Câmara Municipal está calada e cabisbaixa, à sombra da prefeitura, como se não tivesse que legislar e fiscalizar a gestão do município. Ora, os vereadores devem prestar satisfação à sociedade belo-horizontina quanto à real necessidade dos decretos e dos atos unilaterais do alcaide.

Os vereadores, assim como o prefeito, foram eleitos para trabalhar para o povo, pelo povo e com o povo. O que se tem presenciado é o prefeito fazer o que bem entende sem dar a mínima para o povo ou para os parlamentares municipais. Aliás, os vereadores, com raríssimas exceções, estão sendo manipulados pelo prefeito, ao seu estilo, com arrogância e prepotência. O colegiado da Câmara Municipal não vota nem dá um parecer na proteção dos direitos da coletividade, denotando submissão à prefeitura. Isso não é democrático nem representa o retorno do voto dos eleitores, que esperam mais das autoridades com mandato.

Em tempo, de bom alvitre ressaltar que ninguém está aqui a condenar as medidas sanitárias adotadas pela prefeitura, mas que seja na medida certa, sem exageros, e com bastante respeito aos direitos dos cidadãos. Se vidas estão em jogo, com certeza normas precisam ser estabelecidas, mas sem impedir a livre locomoção das pessoas e sem tratamento agressivo ou amedrontador nas barreiras sanitárias. Não se esqueça o prefeito, que a retirada de garantias fundamentais dos indivíduos pode gerar-lhe ações judiciais ou até mesmo investigação das irregularidades por parte do Ministério Público, custos legis. Os riscos de excessos da competência municipal podem ser pedras no sapato do prefeito, que acha que tudo pode, mas não pode. 

Assim, enquanto durar essa pandemia de coronavírus, o melhor a fazer é trabalhar de forma democrática, cidadã e equilibrada.

Wilson Campos (Advogado/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB-MG/Delegado de Prerrogativas da OAB-MG).



Comentários

  1. EXCELENTE DR. WILSON CAMPOS. TUDO QUE EU GOSTARIA DE TER ESCRITO E NÃO ESCREVI., MAS FAÇO SUAS AS MINHAS PALAVRAS . O PODER TEM DE TER LIMITE EM TODOS OS SETORES DA VIDA E PRINCIPALMENTE NA PREFEITURA ONDE O PREFEITO KALIL FAZ O QUE FAZIA NO SEU CLUBE DE FUTEBOL, SÓ QUE A PBH NÃO É TIME DE FUTEBOL, É UMA ADM. PÚBLICA, NOS REGRAMENTOS DA CF/88. NÃO É ISSO MESMO DOUTOR? ELE , O KALIL, AGE E FAZ COMO UM DITADORZINHO E NÃO DÁ SATISFAÇÃO A NINGUÉM E MUITO MENOS AOS VEREADORES QUE COMEM NA MÃO DELE. QUE PAPELÃO DESSES VEREADORES. NA PRÓXIMA ELEIÇÃO A MAIORIA DESSES VEREADORES VAI RODAR.
    PARABÉNS MEU CARO ADVOGADO. ABR. TÁRCIO P. NAVES.

    ResponderExcluir
  2. Eu também vejo assim o exagero de decretos do Kalil que trata os vereadores de BH como se fossem seus empregados da sua empresa falida. Esse senhor começou na prefeitura devendo IPTU quem se lembra? Não pagava nem o imposto da prefeitura e foi eleito pelos atleticanos para prefeito ....prefeito do galo e não prefeito da cidade do povo de BH. Com essa Câmara de Vereadores que está aí fica fácil mandar e desmandar na cidade, são todos medrosos e covarders. Bando de comequietos que ganham seus salários e não fazem nada de bom para BH. Todos.Eu disse todos. Gostei como sempre do belo artigo do Dr. Wilson, esse sim poderia ser o prefeito de BH que estaríamos bem servidas e seguras. Sou cidadã e não abro mão disso. Denise Palhares. BH-Minas - Brasil.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas